Um Exemplo de Tenacidade e de Serviço a Deus
Edificado sob a inspiração de Teresa de Saldanha, o Externato de São José, em Lisboa, mantém viva a sua missão educacional, alicerçada na promoção de valores como a verdade, a solidariedade e o respeito. Em entrevista, a Irmã Maria do Rosário Silva, diretora, explica como a instituição continua a formar gerações de jovens, adaptando o seu projeto pedagógico aos desafios do mundo contemporâneo, sem abdicar dos valores centrais perpetuados pela fundadora.
Perspetiva Atual: O Externato de São José foi um projeto sonhado pela Madre Fundadora da Congregação das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena, Teresa de Saldanha. Atualmente, passadas décadas, a sua missão permanece viva. Como continuam a transmitir os seus valores e princípios aos alunos?
Maria do Rosário Silva: Assente no projeto educacional da sua fundadora, Teresa de Saldanha de Oliveira e Sousa, o Externato de S. José centra a sua missão educativa na formação do espírito, do coração e da inteligência dos seus alunos ao investir na promoção de aprendizagens significativas, no desenvolvimento de competências e de capacidades, e na consolidação de valores como a verdade, a liberdade, o respeito, a amizade, a tolerância e a solidariedade, entre outros.
O valor “Verdade” é visível no dia a dia nas relações estabelecidas entre toda a Comunidade Educativa, com o incremento de uma cultura de pertença, de abertura ao diálogo e de aceitação, tranquila e feliz, das diferenças, em que o respeito pelo outro sobressai, assim como a vivência livre e responsável de escolhas pessoais. Também a amizade transparece nas relações entre alunos e professores, pois a pedagogia é imbuída de afetos, de partilha e de confiança. Olhamos o erro com tolerância, ajudamos a compreendê-lo, a ultrapassá-lo ou a evitá-lo e, pelo perdão, oferecemos um caminho de novas oportunidades. Desenvolvemos, nos nossos alunos, o sentido de solidariedade, num ambiente de sã convivência, de diálogos apaziguadores e de procura de consensos.
A par das tarefas de ensino e de aprendizagem e do acompanhamento e apoio aos alunos, promovemos atividades de complemento curricular e implementamos projetos que, por se desenvolverem em grupo, exigem diálogo e tomada de decisões, autonomia e cooperação, bem como compromisso e resiliência face às dificuldades de resolução de problemas no imediato.
É este ideal que se alimenta e se concretiza, por exemplo, em:
• Trabalhos como a apresentação de uma coreografia, desenhada por um grupo de alunas que, voluntaria e desinteressadamente, a criou e a pôs em cena na Peregrinação Nacional do Rosário e da Família Dominicana, em Fátima, e no espetáculo “Dançar por uma Causa”, a convite da Comissão de Apoio a Vítimas de Tráfico de Pessoas (CAVITP). Trata-se de um dos muitos exemplos de “trabalhos” em que, sem contar para a avaliação, os nossos alunos se envolvem, simplesmente, porque gostam de vivenciar outras formas de aprender, e de partilhar e de dar um pouco de si aos outros.
• Atividades como a Festa de S. José, realizada sempre em data próxima do dia 19 de março e a cargo de um ano, ora do 2º ora do 3º ciclo, de modo que todos os alunos, durante a sua permanência no Externato integrem o elenco desta festa, constitui um exemplo de atividade em que os alunos são desafiados a trabalharem em conjunto em prol de um mesmo objetivo, neste caso, a comemoração do dia de S. José e do Dia do Pai. Os alunos são convidados a consolidar valores e a desenvolver competências diversificadas, desde a elaboração do convite para os pais aos contributos para o guião e para o guarda-roupa, ou desde a construção dos cenários à partilha de papéis.
• Projetos como o HáCá7 (Acampamento dos alunos do 7º ano, que tem lugar na primeira semana de aulas) em que, num contexto de natureza e de interação continuada e próxima com colegas e adultos, os alunos são convidados a realizar aprendizagens teóricas interdisciplinares decorrentes de uma necessidade prática, e a desenvolver competências sociais difíceis de trabalhar no ambiente, mais formal, de uma sala de aula. Também valores como a colaboração, a assertividade e a tolerância são estimulados, de forma que os alunos tomem maior consciência do outro e aprendam a respeitar as ideias dos demais.
PA: Com uma vasta oferta formativa, que vai desde o Jardim de Infância até ao Ensino Secundário, o Externato de São José tem um papel basilar na formação dos jovens. De que forma o projeto pedagógico da instituição é adaptado às necessidades e desafios de cada nível de ensino? Como é feita a interligação entre os diferentes ciclos?
MRS: Cada nível de ensino tem as suas salas específicas localizadas num determinado espaço do Externato, embora partilhem os espaços de serviços (bar, papelaria, reprografia e refeitório), o gimnodesportivo, os auditórios e os espaços de recreio. Constitui exceção o Jardim de Infância que possui refeitório e recreios próprios.
Os horários dos intervalos da manhã e do almoço são desfasados entre os diferentes ciclos para proporcionar mais “espaço” e maior facilidade de acesso aos serviços por parte de todos. Os horários refletem, também, as diferentes necessidades dos alunos, contemplando no 1º CEB (Ciclo do Ensino Básico), mais tempo para brincar junto à hora de almoço e, nos ciclos subsequentes, mais tempo para o apoio ao estudo ou estudo autónomo no final do tempo letivo. Preocupamo-nos em proporcionar aos nossos alunos, logo desde o pré-escolar, o contacto com diferentes ambientes de aprendizagem e a participação em atividades de natureza curricular ou lúdica que contribuam para a sua formação integral, mas ajustadas à idade e ao nível de ensino frequentado. A título de exemplo, a “viagem de finalistas” é de um dia nos cinco anos, de dois no 4.º ano, de três no 6.º ano e de cinco dias no 9.º e 12.º anos.
Próximo do final de cada ano letivo, levamos as crianças dos cinco anos a conhecerem os espaços do 1.º ciclo e as psicólogas escolares realizam ações de sensibilização, que intitulamos de “Aqui vou eu para o 1.º ano” e “A caminho do 5.º ano”, para as crianças terem um primeiro contacto com as mudanças na transição de ciclo e conhecerem algumas características do 1.º ou 5.º anos.
Temos, também, instituída a prática da realização de reuniões, sem uma periodicidade rígida, entre os professores de diferentes ciclos de escolaridade de cada disciplina, a fim de definirem as aprendizagens consideradas pré-requisitos para cada ciclo de escolaridade e de se articularem os diferentes ciclos de escolaridade no que respeita ao grau de aprofundamento de determinados conteúdos.
PA: Além disso, a escola disponibiliza atividades, projetos e extracurriculares que procuram ajudar os alunos a aproveitar os seus tempos livres e a potenciar as suas aptidões e preferências. Como é que esta oferta complementa o projeto educativo da instituição?
MRS: Consciente de que, para muitas famílias, a opção pelo ensino privado é uma prioridade que não deixa recursos para atividades extracurriculares, o Externato de S. José disponibiliza, gratuitamente, aos seus alunos, as seguintes atividades de enriquecimento curricular: Ateliê de Artes Visuais, Pensar-te (uma espécie de Filosofia para crianças), Pequenos Programadores, Coro e TagRugby no 1.º CEB (Ciclo do Ensino Básico); Clube do Teatro, Clube de Leitura e Escrita, Ateliê de Artes Visuais, Pensar-te, Robótica, Coro, Clube de Música, Oficina Musical e Ser Ativo no 2.º CEB; Clube do Teatro, Robótica, Obstacle Course Race (OCR) e Ser Ativo no 3.º CEB.
Com estas atividades reforçamos, de forma lúdica, áreas que, nas aulas, não são passíveis de serem devidamente exploradas e aprofundadas e, no caso, dos Pequenos Programadores e da Robótica, proporcionamos, aos alunos, o contacto com a tecnologia de forma positiva e útil. No âmbito do Desporto Escolar, o Externato oferece o ciclismo no 1.º CEB, e BTT e voleibol feminino no 2.º e 3.º CEB.
Por último, é pertinente destacar o Projeto Orient’Agir (PROA), projeto que integra alunos a partir do 8.º ano e ex-alunos e que permite trabalhar diferentes vertentes da sua formação. A sua evolução no projeto, materializada na atribuição de “ondas” (uma espécie de níveis de desempenho), faz-se mediante a concretização de um conjunto de atividades (de natureza individual, ambiental e solidária) assentes na responsabilização, no compromisso, na gestão/organização de tarefas/tempos e no envolvimento com outros jovens.
PA: De que forma a pastoral marca o quotidiano dos alunos? Que atividades são pensadas para fomentar a comunhão espiritual e moral dos jovens, promovendo valores alinhados com a missão da Congregação?
MRS: A Pastoral promove, no início de cada dia, um momento de oração que é vivido por cada grupo-turma. A partilha e a reflexão geradas por este momento tornam o grupo mais coeso e preparado para a vivência do seu dia numa comunhão com toda a escola. Esta também é vivida em momentos estruturantes como as caminhadas do Advento e da Quaresma.
Para além das celebrações comunitárias de Escola (Eucaristias de Natal e Páscoa), os alunos experienciam atividades onde interiorizam os valores religiosos e humanistas, como “À Descoberta da Torre” (5.ºano) ou o “ConTigo” (8.º ano). “Fazer o bem sempre” de Teresa de Saldanha é muito mais do que uma máxima: é uma disponibilidade para o serviço e para o dom de se dar ao Outro, servindo e sendo luz para todos. E como a luz precisa de alimento para se manter viva, as aulas de Crescer na Fé, de EMRC, a Catequese, a porta sempre aberta da Capela do Externato, a presença diária das Irmãs Dominicanas no dia a dia da escola, a participação de alunos e de outros membros da comunidade educativa em atividades como o Pedalar com Maria, na Peregrinação a pé a Santiago de Compostela 2024, as JMJ – Lisboa 2023, entre outras, avivam esta comunidade educativa, que se deseja feliz, alegre e missionária.
PA: Quais são os objetivos e projetos que planeiam implementar no futuro para conseguir continuar a dar resposta e a adaptarem-se às mudanças iminentes no panorama educacional? Existem áreas específicas de expansão ou desenvolvimento que pretendem priorizar?
MRS: Quanto ao futuro, como escola católica, de inspiração dominicana, só podemos ter uma atitude: a de abertura aos desafios. Propomos levar os nossos alunos a refletir na dimensão ética de questões como a da inteligência artificial, para que esta esteja ao serviço da humanidade, e não o contrário. A nossa atenção está igualmente voltada para a inovação pedagógica, procurando o melhor das novas formas de aprender e de ensinar. Quando trabalhamos com crianças e jovens, o futuro tem de ser sempre a nossa meta, abrindo os braços aos seus desafios para fazermos como o escriba do evangelho que tira do seu tesouro coisas novas e velhas (Mt 13, 52). Assim, ajudamos a formar pessoas que sabem, que têm histórias e caminham com rumo.