
Escola Superior de Enfermagem da Universidade de Coimbra vai continuar “busca incessante pela excelência”
A partir do próximo ano letivo, os cursos da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra passam a integrar a Universidade de Coimbra. O presidente da ESEnfC, António Fernando Amaral, acredita estar perante “uma nova fase institucional” e prevê mais oportunidades para os estudantes. A integração implica o reforço das sinergias interdisciplinares, o fortalecimento da internacionalização e maior acesso a recursos científicos e sociais.
Perspetiva Atual: No próximo ano letivo, os cursos da Escola Superior de Enfermagem já farão parte da oferta formativa da Universidade de Coimbra, pelo que marca uma nova fase institucional. Que benefícios prevê para os estudantes e para a qualidade do ensino com esta integração?
António Fernando Amaral: A Escola Superior de Enfermagem de Coimbra é herdeira de 145 anos de história a formar enfermeiros. Reconhecida nacional e internacionalmente pela qualidade da sua oferta formativa, ancorada em investigação fundamental e aplicada, na internacionalização e na qualidade do seu corpo docente, técnico e administrativo. Ao longo dos anos, sempre apostou numa filosofia de melhoria contínua na busca incessante pela excelência. Com a integração na Universidade de Coimbra, queremos continuar nessa busca. Vamos continuar a formar os melhores Enfermeiros, mas agora com mais oportunidades. Vamos ser integrados numa Universidade com créditos firmados, o que permitirá aos estudantes um mais amplo acesso a serviços na área social, desportiva e científica.
Apesar de a Escola ter, desde há muito, uma Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA: E), avaliada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) com “Muito Bom”, a integração vai trazer mais oportunidades de acesso a fundos para a investigação, mais possibilidade de constituir grupos multidisciplinares, para investigar problemas que têm soluções que só a interdisciplinaridade é capaz de responder. A entrada da Enfermagem na Universidade permite fechar o leque das profissões de saúde, que hoje já trabalham juntas, nas instituições e que passam também a estudar juntas, a conhecer melhor o que cada uma oferece de valor para o cuidado e a saúde das pessoas.
Tenho fundadas esperanças de que o ensino na área da saúde vai melhorar muito em Coimbra pelas sinergias que passam, agora, a ter mais espaço para produzir ainda melhores resultados.

PA: Com esta mudança, os estudantes vão também ter acesso à abertura de novos mestrados e pós-graduações?
AFA: A Escola tem já uma oferta de mestrados e pós-graduações muito ampla. Oferecemos 11 cursos de mestrado em áreas de especialização em Enfermagem que vão desde a saúde materna e obstétrica até ao doente crítico, ao doente crónico, com necessidades paliativas, mental, à saúde pública, à saúde familiar, ao perioperatório, à saúde infantil e pediátrica, à Enfermagem de reabilitação e, ainda, um mestrado académico em Enfermagem na especialidade de gestão de serviços de saúde.
Com a entrada na Universidade, o objetivo não é criar cursos, mas aumentar as sinergias com outras faculdades, para interagir nos vários cursos.
A Escola tem, desde há muitos anos, uma pós-graduação e mestrado conjunto com a Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, na área de gestão e economia das organizações de saúde, que queremos manter e até alargar a outros tipos de cooperação. Para já, os cursos que oferecemos tentam responder não apenas às necessidades das pessoas, que procuram cuidados de saúde, mas também ao desenvolvimento das instituições e dos seus profissionais.
Claro que as necessidades em saúde vão evoluir, colocando novos desafios ao setor. O envelhecimento, as alterações demográficas, as grandes massas de mobilização de pessoas que fogem das condições climáticas extremas, da guerra, com aumento da violência e da vulnerabilidade. Estes desafios serão complexos e exigirão respostas complexas, a que só em conjunto e de forma interdisciplinar o sistema de saúde poderá responder. A Escola quer estar na primeira linha na defesa dessas respostas e ativamente participar nelas. Parece claro que a integração na Universidade torna mais fácil a construção desse tipo de respostas, quer pelas sinergias entre os vários conhecimentos disciplinares, em que cada um aumenta o valor da intervenção, quer pela escala que se pode criar na resposta.
Estaremos sempre disponíveis a inovar, como já fazemos hoje, propondo novas técnicas e tecnologias, novos conhecimentos e, sobretudo, colocando ao serviço novas competências para um cuidado mais centrado nos cidadãos, mais efetivo e um sistema com políticas públicas que assegurem mais acesso, melhor acesso e melhores resultados obtidos e medidos nas pessoas e na saúde e geral.
“A Escola Superior de Enfermagem de Coimbra é herdeira de 145 anos de história a formar enfermeiros. Vamos continuar a formar os melhores Enfermeiros, mas agora com mais oportunidades”
PA: No final do mandato da Direção, torna-se oportuno refletir acerca dos objetivos alcançados até ao momento. Quais foram os principais desafios enfrentados e que metas acredita terem sido atingidas durante este período?
AFA: Durante o mandato, que vai terminar antes do tempo por uma boa causa, tínhamo-nos proposto como prioridade a integração na Universidade de Coimbra. Objetivo cumprido com sucesso e que está numa fase de adaptação dos vários regulamentos, de adoção de novos procedimentos (os que fizerem sentido) e, sobretudo, de transformação.
Outro desafio que tivemos de resolver teve a ver com as progressões dos professores. Quando nos preparávamos para apresentar candidatura, demos conta que algo não estava bem no que diz respeito às progressões indiciárias dos professores. Tínhamos professores que há mais de 20 anos não progrediam na sua carreira. Na altura, investiguei sobre as razões e, ao contrário do que até aqui tinha sido feito, entendi que era necessário fazer alguma coisa, tendo iniciado imediatamente contactos com a tutela, no sentido da explicitação do problema e da necessidade de ser realizado um despacho conjunto entre o ministério que tutelava o Ensino Superior e o das Finanças, que deveria ser anual, por força do exarado no Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), mas que desde a sua publicação nunca tinha sido realizado tal despacho, o que impossibilitava as instituições de garantir os direitos que cabiam aos docentes. Estiveram mal os vários governos e estiveram mal os órgãos de governo da instituição.

Por via deste problema, e talvez por ter alertado, os docentes fizeram greve às avaliações, o que para mim se tornou no momento pior que vivi na Escola. Por um lado, entendia que os professores tinham razão, mas, como Presidente, via que isso estava a prejudicar as progressões dos estudantes, podendo mesmo prejudicar o fim do curso para muitos. Felizmente, conseguiu-se minimizar os prejuízos e os estudantes puderam terminar o curso no tempo certo. Felizmente, também, que o diálogo com o Senhor Ministro da Educação Ciência e Inovação, do governo que resultou das eleições, Professor Doutor Fernando Alexandre, foi produtivo, mostrando-se o Senhor Ministro muito sensível para o problema, e em março de 2025 foi então publicado o referido despacho, que permitiu desbloquear as progressões e minimizar o prejuízo a que os professores estavam sujeitos.
Outro desafio importante teve a ver com a necessidade de rejuvenescimento do corpo docente. Existiram muitas saídas para aposentação e, portanto, houve necessidade de novas admissões para suprir essa sangria. Claro que uma renovação que devia ser progressiva foi uma renovação massiva com entrada de 27 novos docentes durante o meu mandato. Claro que admitir este número de novos professores exige um esforço pela parte de todos os órgãos da escola para a sua integração.
Ainda ao nível do pessoal docente, encontrámos um forte desequilíbrio entre categorias, exigindo a abertura de concursos para lugares de Professor Coordenador, que se manifestou ainda insuficiente dado que a maioria dos professores aposentados, ou que se aposentarão ainda este ano, detêm essa categoria. Durante estes 2 anos, a Escola foi submetida a avaliação institucional, pela A3ES, o que nos ocupou muito do nosso tempo, mas conseguimos uma certificação institucional sem reservas por 6 anos, que é a melhor que se podia ter.
Ao nível da formação, também concluímos o processo de certificação de todos os cursos que lecionamos, tendo obtido também a certificação pelo máximo tempo possível.

Na investigação, a UICISA: E foi submetida a avaliação pela FCT, tendo obtido uma classificação de “Muito Bom”. O PRR também nos deu a possibilidade de, durante este mandato, pequeno, terminar as obras de requalificação da residência e estar presentes em consórcios como o Living the Future Academy, desenhado para trazer à academia novos públicos, novas formações para já licenciados, etc. Fazemos parte de um centro de excelência para a Inovação Pedagógica, estamos no consórcio INOV2CARE, que pretende a modernização da Medicina e das ciências afim como a Enfermagem, o que nos permitiu melhorar os nossos centros de simulação. Estamos no Mais Digital com o objetivo de maior digitalização do processo ensino-aprendizagem, que permitirá chegar a novos públicos, mais diversificados e mais internacionais. No final de 2024, passámos a pertencer ao INOVC+, que é um projeto liderado pela Universidade de Coimbra e gerido pela CCDRC, cujo objetivo principal é a ligação da investigação e inovação ao tecido empresarial e catapultar a transferência de conhecimento e da inovação produzindo valor.
Foram, portanto, 2 anos muito intensos com muitos desafios, mas em nenhuma circunstância perdemos o desígnio de melhorar sempre o nosso ensino de forma a continuar a produzir os “melhores enfermeiros do mundo”. Até ao fim do ano, temos ainda muito a fazer, mas sobretudo queremos garantir que a integração na Universidade possa ser um marco no nosso desenvolvimento e no desenvolvimento da Universidade de Coimbra, onde estudantes e profissionais se sintam bem e satisfeitos com a decisão que tomámos em conjunto.
PA: Certamente, a recente contratação de novos professores adjuntos trouxe renovação ao corpo docente da ESEnfC. De que forma esta renovação contribui para a inovação pedagógica e para a atualização curricular da instituição?
AFA: A entrada de novos docentes é sempre uma preocupação. A Escola criou no meu mandato um manual de acolhimento e uma equipa de acolhimento de professores e de outro pessoal técnico. Esta integração serve não apenas para dar a conhecer a forma de organização, os cantos da casa, os direitos e deveres, mas também a filosofia que está subjacente ao ensino da Enfermagem que advogamos e de que forma os currículos dos vários cursos espelham essa filosofia.
Preocupamo-nos, também, com a sua formação pedagógica e temos planeado um conjunto de ações no âmbito da formação pedagógica para o ensino superior, nomeadamente na utilização de meios digitais, na inteligência artificial, nos processos de avaliação, entre outros. Entendemos que a formação pedagógica é essencial para podermos ter um ensino de qualidade. Esperamos muito destes novos professores que entram numa nova profissão, com exigências diferentes em que não apenas a atividade letiva é importante, mas também a investigação e a prestação de serviços à comunidade como forma de transferência de conhecimento.
“Tenho fundadas esperanças de que o ensino na área da saúde vai melhorar muito em Coimbra pelas sinergias que passam, agora, a ter mais espaço para produzir ainda melhores resultados”
PA: A adesão à Florence Network insere a ESEnfC numa rede europeia dedicada à Enfermagem e Obstetrícia. Esta colaboração internacional pode potenciar a mobilidade académica e o intercâmbio de bons métodos entre instituições?
AFA: A adesão a esta rede faz parte de uma estratégia de internacionalização que não é nova. A Escola pertence e participa de forma ativa num conjunto de redes científicas e de universidades de todo o mundo de que a Florence Network é apenas mais uma.
Pertencemos à Rede Académica das Ciências da Saúde da Lusofonia, à Associação das Universidades de Língua Portuguesa, à Associação Latino-Americana de Escolas e Faculdades de Enfermagem. Somos Centro Colaborador da Organização Mundial de Saúde, alojamos um Capítulo da Sigma Internacional, entre outras com as quais mantemos parcerias ativas, não apenas para a mobilidade, mas também para a investigação. No âmbito do programa Europeu ERASMUS+, possuímos um leque bastante elevado de acordos com universidades europeias. Este é o programa que mais estudantes e professores mobiliza, fazendo com que cerca de 33% dos nossos estudantes façam, durante o seu curso, um período de mobilidade internacional. Também recebemos muitos estudantes de universidades parceiras no âmbito deste programa.
O programa Erasmus+ não tem apenas a mobilidade como foco. A Escola tem, no âmbito da ação-chave 2 deste programa, um conjunto de projetos de parcerias estratégicas e de capacity building com países de fora da Europa que têm potenciado a mobilidade de professores e estudantes (em menor número) e a investigação sobre aspetos relevantes para a inovação do ensino superior. Estes programas têm promovido a troca e o aperfeiçoamento de metodologias de ensino em áreas relevantes para o ensino da Enfermagem.

PA: Com mais de 30% dos estudantes a participarem em programas de mobilidade de Erasmus, a internacionalização é, cada vez mais, uma realidade da ESEnfC. Que impacto tem esta experiência na formação dos estudantes e na sua preparação para os diferentes contextos dos sistemas de saúde?
AFA: A Enfermagem como disciplina e profissão pretende dar resposta às necessidades das pessoas. Necessidades que acontecem ao longo do ciclo vital e que podem estar relacionadas ou não com estados de doença. As variáveis que impactam nas necessidades das pessoas têm várias determinantes, das quais as determinantes sociais e culturais são talvez as mais importantes. Por isso a importância da mobilidade. Lidar com pessoas diferentes, culturas diferentes, formas de estar e de fazer diferentes, é muito relevante para a aprendizagem dos nossos estudantes. Por outro lado, a ideia que temos de formação transformadora fica facilitada quando podemos dar o maior número de experiências aos nossos estudantes. A Escola incentiva, mesmo financeiramente, a essa mobilidade, seja para países europeus, seja para países de fora da Europa, como o Brasil, México, etc.
Tivemos um projeto “MulticulturalCare”, que foi merecedor de um prémio que tem, exatamente, essa dimensão da cultura como variável para cuidar melhor e de forma mais centrada nas pessoas.

Perspetiva Atual: A ESEnfC assinou protocolos de colaboração com dois institutos politécnicos de Angola. Qual é o impacto destas parcerias na formação dos estudantes e na promoção de cuidados de saúde em contextos internacionais?
AFA: A ESEnfC tem, com Angola e com outros países africanos de língua portuguesa, protocolos de cooperação que têm servido, sobretudo, no âmbito da nossa responsabilidade social e de internacionalização, à melhoria da formação nesses países.
Foi assim com Cabo Verde, com cuja Universidade desenhámos e implementámos um curriculum para a licenciatura em Enfermagem e um curso de complemento de formação para já enfermeiros poderem obter o grau de licenciados. Fizemos o mesmo com a Escola Nacional de Saúde da Guiné-Bissau, numa parceria com o Instituto Camões. Os projetos com Angola, nomeadamente com o Instituto Superior Politécnico Tundavala, servem o mesmo propósito de ajudar a formar enfermeiros nesses países.
Perspetiva Atual: Por último, o que prevê ainda ser alcançado em 2025?
AFA: Terminar algumas obras de requalificação dos espaços de formação, proporcionar aos novos professores uma formação pedagógica que os qualifique mais para as tarefas que têm de desempenhar, seja na componente pedagógica, seja na de investigação. Claro que o grande desafio se encontra no processo de integração na Universidade, que se quer sereno e altamente dignificante.