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A importância do Centro de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa para o desenvolvimento da Sociedade e da Ciência

O principal objetivo do Centro de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa (CEAUL), criado em 1975, é contribuir para o avanço e uso adequado da Estatística em Portugal. Marília Antunes, coordenadora do CEAUL e docente há 30 anos, expõe os atuais e futuros desafios para o centro que foi o berço da investigação em Probabilidade e Estatística no nosso país.

Perspetiva Atual: O Centro de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa foi criado em 1975, pelo Professor J. Tiago de Oliveira. Com que intuito nasceu este centro e que áreas de especialização abrange?

Marília Antunes: O CEAUL foi o berço da investigação em Probabilidade e Estatística em Portugal. A existência do Centro, juntamente com o encorajamento e a confiança que o Professor Tiago de Oliveira transmitia às gerações mais novas, permitiu que uma nova geração de investigadores se formasse nestas áreas. O que levou, nomeadamente, ao aparecimento da “Escola de Extremos (e Avaliação de Risco)” em Portugal, atualmente reconhecida pela comunidade científica internacional, e ao desenvolvimento de outras áreas como Amostragem, Processos Estocásticos, Estatística Bayesiana, Estatística Ambiental e Bioestatística.

No seu início, o CEAUL albergou as ciências da Computação e Investigação Operacional. Com o grande desenvolvimento verificado nos anos 80, as Ciências da Computação autonomizaram-se e, mais tarde, já nos anos 90, deu-se a separação da Investigação Operacional. Atualmente, o CEAUL tem um caráter interdisciplinar com várias áreas de aplicação: saúde, educação, pescas, incêndios florestais, seguros, riscos naturais, risco financeiro, aprendizagem automática, entre outras.

PA: De que forma é que a atividade realizada pela equipa do CEAUL contribui continuadamente para o avanço do conhecimento em estatística e suas aplicações?

MA: Alguns membros dedicam-se a desenvolvimentos mais fundamentais na área da Estatística, outros a desenvolvimentos metodológicos suscitados por questões de índole prática e há ainda membros que se dedicam, essencialmente, a aplicações avançadas da Estatística nas outras ciências. As três frentes são importantes para o desenvolvimento da ciência e da sociedade. Na investigação, o trabalho colaborativo tem ainda a vantagem de permitir identificar necessidades em termos metodológicos. Nestas parcerias são desenvolvidas, frequentemente, teses de mestrado e doutoramento contendo avanços nas diferentes áreas.

PA: Relativamente à Professora Marília Antunes, poderia fornecer-nos uma visão geral da sua carreira profissional, antes de chegar ao Centro de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa? Quais os principais desafios com que já se deparou enquanto coordenadora do CEAUL?

MA: Assumi a coordenação do CEAUL no início deste ano e está a ser deveras desafiador. Passei de membro de equipa a líder de equipa, sem deixar de me sentir membro. Na bagagem, trago trinta anos de carreira docente e de investigação ao longo dos quais passei também por cargos de gestão no departamento e na faculdade, pela coordenação de ciclos de estudos e pela participação na direção da Sociedade Portuguesa de Estatística. A liderança de projetos também me ajudou a desenvolver a capacidade de gerir equipas e financiamento. 
O grande desafio para este ciclo de coordenação é fortalecer o CEAUL, fazendo-o crescer com olhos postos na excelência. Reforçar parcerias, dinamizar a internacionalização e atrair talento, sem esquecer que o maior capital que detemos é o humano. Estou confiante que iremos longe, pois vamos juntos, somos uma equipa.

PA: Voltando à estrutura e atividade do CEAUL, de que modo estão organizados os grupos de investigação do Centro?
MA: O CEAUL não tem grupos de investigação formais, embora estes acabem sempre por surgir naturalmente, aproximando os investigadores com interesses comuns. Acho que a não existência de grupos formais dentro do CEAUL, pode apresentar-se como uma vantagem, no sentido de cultivar o sentimento de pertença a uma mesma unidade.

PA: Poderia dar alguns exemplos de projetos ou iniciativas importantes que o CEAUL tenha liderado ou em que tenha participado recentemente? Relativamente aos que estão neste momento em execução, existe algum projeto que esteja a suscitar uma maior expectativa na comunidade do CEAUL ou na comunidade científica, em geral?
MA: O CEAUL conta com uma lista longa de projetos nas áreas da Teoria de Valores Extremos e Estatística Espacial, alguns destes com aplicações muito concretas e de muito interesse para a sociedade, como a ocorrência de eventos meteorológicos extremos com danos na rede de distribuição de eletricidade e fogos florestais de elevada dimensão. Outros exemplos são projetos na área das pescas, com foco na distribuição e abundância das espécies, e na agricultura. A área da saúde conta também com forte participação do CEAUL, tanto em projetos nacionais, como internacionais. No contexto de combate à COVID-19, estivemos também presentes na luta contra a desinformação e na utilização de águas residuais como formas de deteção precoce de novos surtos da epidemia. Destaco, também, dois projetos internacionais multidisciplinares, um na área do envelhecimento (PERSSILAA) e outro na área do cancro (CINDERELLA), em que o CEAUL lidera a componente estatística. Estes são apenas alguns exemplos.

PA: Quais são os desafios atuais e futuros para a investigação em Estatística e Aplicações? O CEAUL está preparado para enfrentar esses desafios e continuar a avançar na sua missão de liderar a investigação nesta área?

MA: Vivemos uma época de aceleração, de alta velocidade, de volumes enormes de dados, de desejo de respostas quase instantâneas e de uma grande valorização do automático. Acho que o desafio para a Estatística é o da adequação das metodologias ao novo paradigma e, claro, continuar a inovar. No CEAUL, trabalhamos para sermos atores dessa evolução. Tal passa pelo desenvolvimento de projetos próprios e em parceria, tanto com investigadores de outras áreas, como com instituições e empresas. Estes últimos reconhecem cada vez mais o valor da integração da ciência na sua atividade, enquanto alavanca para a competitividade. Neste propósito, o CEAUL integra a rede PT-MATHS-IN, o núcleo português da European Service Network of Mathematics for Industry and Innovation – EU-MATHS-IN.

PA: O Centro de Estatística e Aplicações está ligado ao Departamento de Estatística e Investigação Operacional (DEIO) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), o que garante ao CEAUL todos os meios e infraestruturas necessárias para a prossecução das suas atividades. Esta ligação com a faculdade é também uma mais-valia para os estudantes? De que modo é que o CEAUL está envolvido na formação de novos profissionais destas áreas?

MA: O CEAUL é uma mais-valia para os estudantes das áreas da Estatística e da Matemática Aplicada e também para alunos das áreas das Ciências da Vida interessados numa vertente mais quantitativa. Há já vários anos que o CEAUL promove a integração de alunos em estágios em ambiente empresarial e em instituições ligadas à investigação, sempre com orientação de membros do CEAUL. Temos também um programa de bolsas de iniciação à investigação para alunos de licenciatura, bolsas de investigação para estudantes de mestrado e bolsas de doutoramento.

PA: Relativamente à difusão de conhecimento, como é realizada a transmissão dos resultados dos estudos do CEAUL para a comunidade científica e para a população em geral? É importante que a sociedade esteja devidamente informada sobre estas áreas? Por quê? 

MA: Para além dos seminários regulares, abertos à comunidade, estamos também presentes nas redes sociais (Twitter, LinkedIn, Facebook, Instagram). O CEAUL, através de alguns dos seus membros, e envolvendo jovens estudantes de licenciatura e mestrado, foi um parceiro importante para a rubrica Dados Contados do programa Europa Minha, da RTP. Tratou-se do que entendemos ser, também, a nossa missão: promover a comunicação rigorosa de números e a literacia estatística. Nos últimos anos, membros do CEAUL têm também publicado artigos de opinião em jornais de circulação nacional sobre a importância da Estatística para uma cidadania efetiva e contra a desinformação e o inadequado uso da Estatística em determinados contextos, nomeadamente na área da saúde, como ocorreu durante a pandemia de COVID-19.

PA: A nível económico, além do apoio da FCT, que programas sustentam a atividade do CEAUL?
MA: Há muito que dirigimos esforços para a geração de receitas próprias. Estas são um importante complemento no financiamento da atividade científica dos membros e permitem impulsionar a formação de jovens investigadores através de bolsas. As receitas têm origem em prestações de serviços de consultoria e de ações de formação.

PA: Quais são as grandes metas da atual direção do Centro para os próximos anos?
MA:
Somos sempre ambiciosos. Queremos produzir mais e melhor ciência, servir mais e melhor a sociedade. Para isso, precisamos de crescer. Uma das grandes metas é, por isso, a aposta na captação de jovens investigadores, contrariando a fuga dos alunos mais talentosos para as empresas. Esta é uma tarefa muito difícil, pois na nossa área o desemprego é residual, mas a vontade de o fazer é grande. É pelos jovens que passa o futuro.

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