Ensino e Investigação como Motores de Crescimento Regional

A Universidade da Madeira tem sido crucial para o desenvolvimento social e económico da Região Autónoma. Sílvio Fernandes, reitor, destaca que, além de formar profissionais qualificados, a instituição cria postos de trabalho e estabelece importantes parcerias com empresas locais, promovendo o desenvolvimento de serviços e infraestruturas.

Perspetiva Atual: A Universidade da Madeira (UMa) visa encontrar soluções adequadas, num quadro de responsabilidade, equidade e sustentabilidade, que contribuam para o desenvolvimento e afirmação da Madeira. Poderia descrever exemplos concretos de como a UMa contribui diretamente para o crescimento da economia local, através da criação de postos de trabalho e o desenvolvimento de serviços e infraestruturas?

Sílvio Fernandes: A Universidade da Madeira tem, desde a sua criação, em setembro de 1988, desempenhado um papel importante no desenvolvimento da Região Autónoma da Madeira. É de destacar, na sua fase inicial, o contributo para dotar a Região de recursos humanos especializados na área da docência, e, posteriormente, nas áreas que constituem a oferta formativa atual da UMa. Nos seus quase 36 anos de existência, a UMa já diplomou cerca de 15 mil dos seus estudantes, que se evidenciam em setores tão diversos como a educação e o ensino, a hotelaria, a gestão de empresas, o desporto e a atividade física, a enfermagem, a medicina, a informática, a psicologia, o design, as artes, as línguas, a comunicação, a cultura, a biologia, a bioquímica, entre muitas outras. Na realidade, a presença da UMa e dos recursos humanos que formou e especializou é cada vez mais evidente, não só no exercício especializado nas suas ocupações profissionais, como também na liderança de empresas e de instituições.

PA: Existem atualmente parcerias ativas entre a UMa e o tecido empresarial insular? Se sim, pode fornecer exemplos de algumas dessas colaborações e mencionar os benefícios adjacentes?

SF: A UMa tem em vigor um assinalável número de parcerias e protocolos de colaboração com empresas. As que mais se destacam são as que têm atividade conjunta em matéria de investigação e transferência de conhecimento ou prestação de serviços, e as que, ao abrigo da lei do Mecenato ou de colaboração interinstitucional, apoiam estudantes da UMa, através da atribuição de bolsas de estudo. Refira-se ainda que a UMa integra instituições de ciência e tecnologia, como a Agência Regional para o Desenvolvimento, Investigação, Tecnologia e Inovação (ARDITI) e empreendedorismo (Starturp Madeira).

PA: De entre a excelência do Ensino, as infraestruturas modernas e a qualidade de vida na ilha, quais são os principais atrativos que a UMa dispõe para convencer estudantes nacionais e internacionais?

SF: A Madeira oferece um ecossistema integrado de conhecimento e experiências interpessoais e culturais, de que se releva o seu cosmopolitismo, muito favorável ao crescimento necessário para enfrentar a idade adulta e, consequentemente, a integração no mercado de trabalho. Formar-se e viver num arquipélago com o desenvolvimento e a posição geoestratégica da Madeira é estar em contacto com uma realidade socioeconómica e cultural em constante transformação. É, igualmente, pela própria natureza da condição insular, uma forma de lidar com a pulsão de sair e regressar, de se motivar para uma atualização permanente, para conhecer mundo e dele retirar para o nosso desenvolvimento o que melhor se lhe adequa. É, em resumo, viver no mundo para o mundo.

PA: Que estratégias em particular a Universidade adota para superar desafios como o isolamento geográfico e promover competitivamente a instituição?

SF: Como ficou referido na resposta anterior, a propensão para sair da ilha esconde muitas vezes o mito do isolamento geográfico. No tempo em que vivemos, fortemente marcado pela sociedade da informação e do conhecimento, a noção de isolamento é relativa. Além disso, a capacidade de mobilidade tem levado a suprir distâncias e, especificamente, no caso do ensino superior, a permitir que estudantes e docentes acedam aos saberes e partilhem experiências, que os colocam, quando sabem explorar de forma eficaz esses meios, em patamares de qualidade assinaláveis. É, nesse sentido, que a Universidade da Madeira promove o Programa ERASMUS+, que coloca estudantes em contacto com realidades académicas europeias e, inversamente, recebe estudantes de universidades europeias que desejam experienciar um semestre ou um ano na RAM, vivendo e convivendo com os nossos estudantes e formando-se na nossa Academia. Por outro lado, a participação dos nossos investigadores e docentes em projetos internacionais de investigação, em redes de ciência e tecnologia, em instituições de I&D, em congressos e eventos científicos, é um indicador claro de capacidade de ultrapassar o cada vez mais aparente “isolamento geográfico”.

PA: Além das Faculdades de Artes e Humanidades, Ciências Exatas e da Engenharia, Ciências Sociais e Ciências da Vida, a UMa ainda integra as Escolas Superiores de Tecnologias e Gestão e de Saúde. Considerando a extensa variedade de cursos, de que forma a oferta formativa é estruturada e atualizada de acordo com os desafios atuais do mercado de trabalho?

SF: A Universidade da Madeira tem por missão responder aos desafios que o meio envolvente coloca, seja o meio confinado à Região Autónoma da Madeira (RAM), seja o meio mais amplo do país ou do mundo a que estamos interligados. Nesse sentido, a atual oferta tem por objetivo munir a sociedade de recursos especializados que, embora adequados, exigem da Universidade da Madeira uma constante atenção de modo a reforçar ou renovar essa oferta em função de novas realidades. O Plano de Desenvolvimento da UMa estabelece que esse lastro formativo será acrescido de novos cursos em áreas estratégicas como a Saúde, o Turismo, o Mar e a Transformação Digital. Ao reforço do atual Projeto de Turismo, com a criação da Escola Internacional de Turismo, juntar-se-ão os seguintes cursos, ainda em fase de acreditação: Ciências e Tecnologias do Mar (1º ciclo), Engenharia Biomédica (1º ciclo), e Engenharia Física e Computacional. Encontram-se em processo de elaboração, propostas no sentido de aumentar a oferta na área da Informática, com pós-graduações e outras formações em especialidades como a cibersegurança, a Ciência de Dados e a Inteligência Artificial; e na área da Saúde. Há, igualmente, a proposta de a UMa reforçar a sua formação para a docência e nos cursos técnicos superiores profissionais.

PA: Existem programas de apoio à transição para o mercado de trabalho destinados a alunos recém-formados na UMa? Que tipo de auxílio a instituição promove – como feiras de empregos, estágios ou redes de contactos – para ajudar os jovens a se inserirem num contexto profissional mais facilmente?

SF: Anualmente, o Observatório de Emprego e Formação Profissional da UMa organiza, conjuntamente com o Polo de Emprego da UMa, o Fórum de Empregabilidade, que decorre durante dois dias, no Campus Universitário da Penteada. Este evento conta com 10 edições e contempla palestras formativas, stands de empresas, que disponibilizam informação sobre ofertas de emprego e efetuam entrevistas de emprego. O Polo de Emprego presta, ao longo do ano letivo, apoio aos estudantes e dá orientações em matérias de preparação de currículo e de entrevistas. Apoia, igualmente, na divulgação e na procura de oportunidades de emprego e de estágios, bem como na organização de conferências que colocam em interação, em sala, entidades empregadoras e estudantes da UMa desde o primeiro ano da sua formação.

Outra via privilegiada de promoção do acesso ao emprego é a do estabelecimento de parcerias com contratos de estágio para estudantes da UMa. Alguns desses estágios fazem parte da formação académica dos estudantes, como são, por exemplo, os casos da licenciatura em Direção e Gestão Hoteleira, do curso de enfermagem e dos cursos de formação para a docência. Há ainda o exemplo dos cursos técnicos superiores profissionais (CTesP), que têm um plano de estudos orientado para a formação em contexto profissional. A UMa participa também na Rede Poliempreende, que promove o empreendedorismo nacional no ensino superior politécnico. Trata-se de uma rede que incide a sua ação no desenvolvimento de competências empreendedoras de vocação empresarial. Ainda neste âmbito, a UMa mantém a parceria estratégica com a Startup Madeira, através de eventos, projetos e prémios de apoio ao empreendedorismo jovem, destinado a estudantes universitários.

PA: A UMa investe igualmente na investigação científica, albergando o Centro de Investigação em Educação e ainda o Centro de Química da Madeira. Desta forma, quais projetos de investigação atualmente em curso destacaria?

SF: A Universidade da Madeira tem dois centros de investigação, financiados pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), três centros partilhados e sete polos de centros FCT. Além disso, tem seis centros de investigação, que não sendo centros FCT, têm muita atividade de investigação.

No que diz respeito a projetos de investigação, é de destacar, o projeto “APECHE”, do Centro de Investigação em Educação, coordenado pelo Professor   Hélder Spínola. É um projeto financiado pela FCT, que tem como principal objetivo proporcionar uma melhor compreensão da Literacia Ambiental (LA) e da Cultura Ambiental (CA) no ensino superior português, bem como contribuir para a sua melhoria, incidindo a pesquisa na caracterização dos níveis de LA e sua evolução, e nas variáveis que mais influenciam esses resultados, nomeadamente o grau de incorporação da CA, e dando orientações para o seu melhor desempenho. Para tal, foi reunida uma equipa multidisciplinar com competência e experiência em Educação e Ambiente, com investigadores distribuídos por oito instituições e ensino superior (IES), de norte a sul de Portugal Continental, da Madeira e dos Açores.

É, igualmente, de destacar o projeto “PASPACK 4.0 – Producing Alternative and Sustainable food bio-based PACKaging from Mediterranean agri-food by-products and waste”, do Centro de Química da Madeira, coordenado pelo Professor José Câmara. Este projeto reúne 14 parceiros de oito países da região Euro-Mediterrânica e tem como principal objetivo fornecer soluções alternativas para dois grandes desafios do mundo contemporâneo, nomeadamente o uso excessivo de plásticos (incluindo os utilizados em embalagens alimentares) e, simultaneamente, contribuir para diminuir a quantidade crescente do desperdício e perda de alimentos.

PA: Possuem algum projeto em particular que tire partido dos recursos naturais únicos e das características geográficas e ambientais da ilha? Se sim, em que se baseia, quais são as aplicações práticas e de que forma pretendem promover a posterior disseminação dos resultados?

SF: O projeto “isUP-AgrO: Unlocking the Potential for Agricultural research on an EU Outmost region: boosting ISOPlexis Centre”, coordenado pela Professora Carla Ragonezi, do Centro de Investigação ISOPlexis, foi recentemente aprovado pela União Europeia, no âmbito do Programa Horizon Europe, tendo em vista a melhoria da atividade de investigação do ISOPlexis – Centro de Agricultura Sustentável e Tecnologia Alimentar, a fim de criar um centro de excelência de investigação para o sector agricultura e do agroalimentar.

Este projeto de investigação visa aplicar competências e capacidades conjuntas da rede e metodologias, recentemente aprendidas para aprofundar a compreensão do papel das interações bióticas e abióticas na produção e qualidade da uva de diferentes castas da Madeira, e “recomendar possíveis” medidas para melhorar os serviços vitivinícolas para a indústria do vinho.

PA: A UMa promove e facilita a mobilidade nacional e internacional dos estudantes e corpo docente? Quais são os programas de intercâmbio disponíveis e como contribuem para o enriquecimento académico?

SF: Sendo 90% dos alunos da UMa naturais da Madeira, a nossa Academia, percebeu, desde muito cedo, a importância de proporcionar aos seus estudantes a oportunidade de estudar, durante um semestre ou um ano, numa outra IES do país (bolsas Almeida Garrett ou Vasco da Gama) ou da Europa (Erasmus + ou Santander de apoio à mobilidade). É também oferecida aos nossos estudantes, ou recém-diplomados pela UMa, a oportunidade de estagiarem fora da Madeira. Estando a UMa na ultraperiferia da Europa, as nossos bolsas Erasmus+ são majoradas. Por essa razão, os nossos alunos recebem uma bolsa de mobilidade, cujo valor é quase o dobro do das bolsas que recebem os estudantes das IES de Portugal Continental

Os docentes da UMa e o pessoal técnico administrativo e de gestão têm aderido cada vez mais às mobilidades Erasmus +.

Todas estas mobilidades são uma mais-valia para os que nela participam.  Ver outras formas de fazer, contactar com outras culturas de trabalho/estudo enriquece quem delas usufrui.

Mais recentemente temos criado oportunidades para que os nossos alunos participem em BIPs (Blended Intensive programme – Erasmus+), incoming e outgoing, que proporcionam mobilidades mais curtas (cinco dias) mas igualmente importantes e desafiadoras.

PA: Quais são os principais objetivos e metas estabelecidos para os próximos anos e, de que forma, a UMa pretende alcançá-los? Existem iniciativas inovadoras que possam ser destacadas?

SF: A Universidade da Madeira tem um projeto ambicioso de desenvolvimento que, sucintamente, pode ser resumido da seguinte forma:

  1. A reforma da oferta formativa, de modo a garantir a qualidade que estrutura o espetro atual que é oferecido aos estudantes. Dessa reforma resultará a aposta em áreas estratégicas como o Turismo, o Mar, a Saúde e a Informática, para além de se equacionar outras áreas sobretudo ao nível dos CTeSP e de formação pós-graduada, bem com a formação ao longo da vida.
  2. A Internacionalização. A UMa tem todas as condições para aumentar a percentagem de estudantes internacionais, seja por via das candidaturas aos cursos em funcionamento, seja através do aumento da capacidade de atrair alunos no âmbito do Programa Erasmus+. A internacionalização também se faz através do incremento de redes de cooperação interinstitucional e de investigação científica. Estudantes e docentes, sobretudo ao nível de mestrados e doutoramentos podem vir a beneficiar desse sistema de parcerias e projetos.
  3. O desenvolvimento Científico e Tecnológico. A UMa, através das suas unidades de investigação, da sua inserção na rede nacional de I&D, da sua participação na ARDITI e colaboração com outras estruturas científicas nacionais e internacionais, pretende continuar a ganhar dimensão nesta área de intervenção. Nos últimos anos a UMa tem estado a crescer no montante de projetos que gere. É desejável que, depois de ter estabilizado na gestão de entre 10 a 12 milhões de euros anuais, possa poder duplicar essa capacidade, com os consequentes benefícios em termos de qualidade, de capacidade de transferência de conhecimento e de prestígio académico.
  4. A contribuição para o desenvolvimento do espaço estratégico da Macaronésia, através de parcerias privilegiadas com as suas congéneres dos Açores, de Canárias e de Cabo Verde. Trata-se de um projeto que assenta na experiência adquirida nos Programas MAC (Madeira, Açores, Canárias) e no curso de doutoramento em Ilhas Atlânticas, atualmente em funcionamento, que constitui um exemplo de colaboração interinstitucional neste espaço do Atlântico. Será igualmente muito proveitosa a aposta na área do Mar, tema que é comum aos arquipélagos da Macaronésia, podendo proporcionar um rápido desenvolvimento de âmbito educacional, científico, tecnológico e económico, de interesse comum.

A visão, necessariamente sintética que está associada a estas linhas de ação estratégica ajudarão a projetar a Universidade da Madeira, fazendo com que ganhe mais dimensão e notoriedade.

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