A criatividade como elemento central das Nanociências
No i3N, a criatividade é mais do que uma virtude: é o segredo que tem guiado, há 19 anos, a investigação em Nanoestruturas, Nanomodelação e Nanofabricação. Desde a sua criação em 2006, fruto da parceria entre CENIMAT e FSCOSD, o Instituto publicou mais de 16.000 artigos científicos, registou 58 patentes, desenvolveu 45 protótipos e conquistou 12 bolsas do European Research Council (ERC), resultados que, aos olhos de Rodrigo Martins, Diretor do i3N, “refletem a capacidade do i3N de servir e inovar”.
Perspetiva Atual: Desde a sua criação, em 2006, o Instituto de Nanoestruturas, Nanomodelação e Nanofabricação (i3N) tem desenvolvido investigação nas áreas da nanotecnologia, nanociências e dos materiais avançados. Após 19 anos de atividade, que balanço faz desse trajeto?
Rodrigo Martins: Desde sua criação em 2006, resultado da parceria entre duas instituições de referência em ciência fundamental e aplicada — o CENIMAT (Universidade NOVA de Lisboa) e o FSCOSD (Universidade de Aveiro) — o i3N consolidou-se e expandiu-se como uma referência nacional e internacional em materiais funcionais avançados, com aplicações em saúde, energia, mobilidade, eletrónica e construções inteligentes, considerados pilares essenciais para a prosperidade global, europeia e nacional. Toda a atividade de I&D do i3N foca-se na sustentabilidade, tanto nas tecnologias quanto nos produtos, apoiada em modelos físicos que orientam a produção e aplicação de ideias inovadoras em nanotecnologia, nanociências e materiais avançados. Os 19 anos de trajetória refletem a capacidade do i3N de servir e inovar, onde a criatividade é o elemento central.
Esse posicionamento de liderança traduz-se em resultados concretos e impactantes: entre 2018 e 2024, o i3N publicou mais de 16.000 artigos científicos, dos quais 42 são altamente citados, evidenciando reconhecimento internacional. Nesse período, foram registadas patentes, reforçando nosso compromisso com inovação e transferência tecnológica. O instituto atraiu mais de €61 milhões em financiamento, liderou ou participou em mais de 102 projetos e desenvolveu 45 protótipos e demonstradores, muitos com aplicação direta em setores estratégicos como eletrónica, saúde e energia. Outro destaque é que o i3N conquistou 12 bolsas do European Research Council (ERC), reconhecimento que posiciona o instituto entre os melhores centros de investigação europeus. Esses números refletem a maturidade científica do i3N e sua capacidade de contribuir para políticas públicas, inovação industrial e formação avançada. Produzimos conhecimento que se traduz em projetos de grande impacto, impulsionando a indústria do futuro.

PA: A Investigação do i3N está estruturada em quatro áreas temáticas. Em que consistem e como funcionam na prática?
RM: A investigação do i3N organiza-se em quatro áreas temáticas, distribuídas por seis grupos de investigação, com o objetivo de promover ciência e inovação de alta qualidade em Micro/Nanomateriais Funcionais Avançados e Micro/Nanotecnologias, apoiadas por modelação computacional. Essas ações visam fins socioeconómicos, promovendo conceitos inovadores e incentivando o pensamento estratégico para desenvolver produtos ecologicamente sustentáveis.
Na prática, o i3N promove a aplicação dos resultados de R&D+I em: • start-ups e na indústria, além de proporcionar acesso às suas instalações à comunidade técnico-científica externa; • promoção da excelência académica, fomentando um ambiente de trabalho em equipa, baseado na paixão, talento e competências dos membros; • aumento da consciência pública, do envolvimento e da compreensão da ciência e tecnologia à escala nano, promovendo a literacia científica, abrindo o i3N à sociedade e apoiando a formação avançada em áreas como Engenharia de Micro e Nanotecnologias, Engenharia de Materiais, Física Aplicada, Biomateriais e Nanociências.
PA: A colaboração entre diferentes áreas do saber é um dos grandes objetivos do i3N. Considera que a forte coesão multidisciplinar, dentro das infraestruturas, levou a descobertas que não seriam possíveis num contexto mais tradicional e isolado?
RM: A multi e a interdisciplinaridade são os pilares centrais do i3N, onde se exploram a convergência de áreas como física, eletrónica, química, biologia e medicina, aplicadas ao fabrico e uso de materiais avançados, sem os quais não há progresso nem prosperidade. Essa abordagem colaborativa levou a avanços disruptivos em materiais multifuncionais, processos de fabrico ecológicos e na integração de simulação computacional no design de novos dispositivos. Destacamos que somos pioneiros em áreas como eletrónica transparente e papel eletrónico, tecnologias emergentes sustentáveis. Servimos a sociedade em dois vetores essenciais: investigar e formar, nas fronteiras do conhecimento, e aplicar e desenvolver inovação que favoreça a escalabilidade e a aplicação industrial. A experiência do i3N mostra que a soma das competências é muito superior ao valor de cada área individualmente.
PA: Manter-se na vanguarda da investigação e liderar com inovação exige não só excelência científica e adaptação contínua, mas também a formação de novas gerações capazes de acompanhar esse avanço. Como são preparados os estudantes para o mercado de trabalho? E que desafios têm persistido, ao longo das duas décadas de investigação?
RM: A Europa enfrenta um défice significativo de especialistas em manufatura avançada, engenharia de processos e competências digitais, áreas onde os materiais avançados são essenciais. O i3N considera a formação uma parte fundamental de sua missão, destacando-se especialmente em:
Materiais Funcionais Avançados: desenvolvidos com pegada ambiental reduzida e alinhados com princípios de reciclagem, sustentabilidade e economia circular.
• Materiais Verdes: ambientalmente sustentáveis ao longo de todo o ciclo de vida, contribuindo para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.
• Materiais Simples e Seguros: abundantes, sustentáveis e que apoiam a economia circular. Nesse contexto, buscamos fortalecer colaborações transfronteiriças.
De acordo com essa visão e missão, no i3N, mestrandos, doutorandos e pós-doutorandos participam de projetos de ponta, com acesso a infraestruturas, na vanguarda mundial. Previligiamos tanto a ciência na fronteira do conhecimento quanto sua aplicação tecnológica, preparando jovens para carreiras académicas e industriais, que Portugal e a Europa tanto precisam. Para isso, o i3N oferece programas de mobilidade, parcerias internacionais e uma cultura de excelência, garantindo que os nossos formandos competem, ao mais alto nível.

PA: A sustentabilidade do instituto passa pela otimização das colaborações e pelo planeamento antecipado de projetos de mobilidade e networking, a nível nacional e internacional. Como é que descreve a atual relação do i3N com outros centros de investigação ou entidades internacionais? Existe algum projeto em curso que gostaria de destacar?
RM: A colaboração do i3N com redes de investigação e entidades internacionais tem sido estratégica e de grande impacto. Destacam-se parcerias como o projeto EMERGE — Infraestrutura de Investigação em Eletrónica Impressa Emergente — uma iniciativa inovadora que visa criar uma plataforma multidisciplinar para desenvolver, testar e aplicar tecnologias de eletrónica impressa, em sistemas/produtos flexíveis e de baixo custo, fomentando um ecossistema de inovação sustentável e competitivo, usando novos semicondutores emergentes. Outro exemplo é o consórcio do projeto INFRACHIP — infraestrutura de Investigação Europeia em Chips de Semicondutores — uma iniciativa estratégica para reforçar a competitividade europeia, acelerando a inovação no setor de semicondutores, essencial para indústrias como eletrónica, telecomunicações, automóvel, aeroespacial, saúde e energias renováveis, impulsionando o crescimento sustentável e gerando empregos qualificados na Europa. Destaco também a parceria NANOMAT, que, envolvendo a academia, municípios, indústrias, PME e institutos de investigação, promove a colaboração para impulsionar a criatividade, transferência de conhecimento e aplicação de materiais em diversos setores industriais e tecnológicos.
O i3N participa ainda do projeto POEMS, consolidando uma plataforma nacional relevante no setor de semicondutores. Dentro dessa estratégia, trabalhamos para ampliar os nossos serviços, apoiando empresas e a academia. Todas essas colaborações reforçam o papel do instituto como elo entre ciência e indústria, demonstrando liderança nacional e internacional.
PA: De que forma o i3N promove o avanço da nanotecnologia e dos materiais avançados em Portugal, contribuindo também para o aumento das oportunidades de emprego?
RM: O i3N é muito mais do que um centro de ciência: é um motor de desenvolvimento económico, impulsionado pela criatividade e inovação que promove. A sua atividade apoia start-ups e indústrias de vanguarda, criando protótipos para PME e transferindo tecnologia para setores estratégicos como semicondutores, saúde, eletrónica e energia. Sem materiais funcionais e a digitalização, não haverá prosperidade, nem conforto e bem-estar. Estamos na linha da frente na criação dessas soluções. Estas atividades contribuem diretamente para a criação de empregos altamente qualificados e fortalecem a competitividade de Portugal, especialmente num contexto de transição digital e ecológica.

PA: À medida que o i3N cresce em tamanho e alcance, também aumenta a atenção dada ao seu trabalho. Acredita que, nos últimos anos, o papel destes investigadores tem vindo a ser mais valorizado?
RM: Nos últimos anos, a sociedade portuguesa, assim como a europeia, passou a valorizar de forma mais significativa o papel da ciência. O i3N beneficiou deste movimento, conquistando maior visibilidade e reconhecimento público, o que se reflete na atração de jovens talentosos e na confiança que entidades financiadoras têm depositado em nós. Comprometemo-nos a não defraudar essas expectativas! Mantemos o compromisso de consolidar a perceção de que ciência e inovação são essenciais para prosperidade, indústria forte e sociedade baseada em conhecimento, criatividade e evolução tecnológica.
PA: Quase no fim de 2025, que objetivos foram alcançados e que projetos de investigação já foram delineados para o próximo ano?
RM: Em 2025, o i3N consolidou a sua liderança em materiais avançados e eletrónica sustentável, alargou colaborações internacionais e adquiriu equipamentos de ponta únicos em Portugal. Para 2026, os planos incluem expandir o legado do projeto EMERGE, reforçar a nossa participação no INFRACHIP, lançar novas iniciativas de transferência tecnológica e incubação de start-ups, investir na divulgação científica e promover formação avançada em micro e nanotecnologias, materiais avançados para energia, eletrónica, aeroespacial, agroindustrial e saúde.
PA: Como antevê o futuro da Nanotecnologia em Portugal?
RM: O futuro da nanotecnologia em Portugal será definido por uma forte integração entre ciência, indústria e sociedade, promovendo um ecossistema inovador e colaborativo. O i3N continuará a desempenhar um papel fundamental, não apenas na produção de conhecimento científico de ponta, mas também na sua transformação em soluções práticas que beneficiem a sociedade e impulsionem o desenvolvimento económico. Somos um motor potente na transição energética, na promoção de mobilidade sustentável e na afirmação da soberania europeia no setor dos semicondutores e das tecnologias emergentes.
A realidade mostra que é imperativo fazer mais com menos materiais. Ou seja, é necessário transformar, em escala nanométrica, o que atualmente construímos em microescala. As nanotecnologias são a chave para criar soluções inovadoras, sustentáveis e eficientes, respondendo aos desafios de recursos minerais limitados, por um futuro mais consciente e resiliente. Com essa visão, o i3N destaca Portugal no mapa mundial da nanotecnologia, contribuindo para que seja reconhecido internacionalmente como referência em inovação tecnológica e sustentabilidade. Isto é, consolidar a nanotecnologia como uma alavanca essencial para o crescimento económico, o progresso social e a capacidade de Portugal enfrentar com confiança os desafios do futuro.
Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto UID/50025 e Laboratório Associado I3N – LA/P/0037/2020


