
Os computadores como aliados de uma geração que pode transformar a ciência
Com raízes que remontam à década de 80, o Departamento de Ciência de Computadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (DCC-FCUP) afirma-se como um dos pilares da formação e investigação em informática, em Portugal. Segundo Fernando Silva, o responsável pelo DCC, “a informática é, hoje, uma área que se interliga e potencia muitas outras áreas do conhecimento”. O DCC conta atualmente com 44 professores e uma oferta formativa renovada, incluindo o Mestrado em Segurança Informática e a Licenciatura em Inteligência Artificial e Ciência de Dados.
Perspetiva Atual: O Departamento de Ciência de Computadores afirma ter como missão assegurar um programa de excelência no ensino, na investigação e serviços à comunidade na área. Que medidas têm sido adotadas para assegurar este compromisso nos três ciclos de formação?
Fernando Silva: O Departamento de Ciência de Computadores (DCC) celebra, em 2025, os 40 Anos da Licenciatura em Ciência de Computadores na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP). Foi em setembro de 1985 que a FCUP lançou a primeira licenciatura da Universidade do Porto, dedicada à formação de especialistas em informática, com um número clausus de 20 estudantes. Atualmente, o DCC é (co)responsável pela formação de mais de 2500 estudantes nos três ciclos de ensino e está envolvido em 4 licenciaturas, 7 mestrados e 2 programas doutorais. O Departamento presta também serviço docente a outros cursos da FCUP.

de Ciência de Computadores da Faculdade
de Ciências da Universidade do Porto
O DCC tem um compromisso com a excelência da formação. Nesse sentido, tem vindo a adequar o seu corpo docente em número, atingindo em 2025 os 44 docentes de carreira, e a renovar a sua oferta formativa, adequando-a à constante evolução tecnológica que se verifica na área da informática e às necessidades do mercado atual. Por exemplo, ainda nos anos 90 iniciámos uma oferta formativa em Engenharia de Redes e Sistemas Informáticos, antecipando a necessidade de especialistas em administração de sistemas e redes e em 2014 o Mestrado em Segurança Informática. Mais recentemente, fomos co-responsáveis pela primeira licenciatura em Inteligência Artificial e Ciência de Dados, uma área que hoje tem um impacto inegável na inovação tecnológica. Ao nível da formação em mestrados destacam-se ainda os mestrados em Ciência de Computadores, Inteligência Artificial, Informática Médica, e Ciência de Dados todas eles com um forte impacto nas empresas, serviços e sociedade em geral.
A estratégia de formação assenta num corpo docente cientificamente qualificado que, a par do ensino, desenvolve atividade de excelência na investigação e transferência de tecnologia. A Ciência de Computadores divide-se em várias subáreas de teoria e prática de computação, tendo o DCC especialistas em fundamentos da computação, algoritmos e estruturas de dados, linguagens de programação, sistemas operativos, computação paralela, sistemas distribuídos, redes de computadores, segurança informática, inteligência artificial, ciência de dados, bioinformática, informática médica e computação gráfica.
PA: Este Departamento conta com dezenas de docentes doutorados e atualiza regularmente os seus cursos. Tendo em conta a rápida evolução tecnológica, como é feita a atualização dos conteúdos lecionados para garantir a sua relevância na área informática?
Fernando Silva: Os docentes do DCC estão todos integrados em centros de investigação classificados como excelentes ou muito bons, por exemplo: INESC TEC, CMUP, IT, LIACC. A atualização dos conteúdos pedagógicos resulta, naturalmente, da atividade de investigação dos docentes, profundamente envolvidos nas frentes mais avançadas da ciência e tecnologia. A participação ativa em projetos científicos, nacionais e internacionais, e a colaboração com empresas e instituições garantem que os conteúdos lecionados estão alinhados com o estado da arte e com os desafios reais da sociedade.

PA: As licenciaturas e mestrados da responsabilidade do DCC oferecem um vasto leque de saídas profissionais, numa diversidade de setores de atividade. Como são preparados os estudantes para responder às necessidades específicas de cada setor?
Fernando Silva: A estratégia do DCC na formação especializada nas subáreas disciplinares dos cursos em que tem (co)responsabilidade orienta-se por assegurar uma formação sólida aos seus formandos, habilitando-os para um acompanhamento autónomo e independente do progresso na área, com incidência em áreas fundamentais, mas nunca perdendo de vista a realização prática dos conhecimentos e competências adquiridas.
A nossa formação procura um equilíbrio entre o conhecimento conceptual e a sua aplicação, através de projetos onde se propõe a resolução de problemas reais, bem como o desenvolvimento de competências no trabalho e coordenação de equipas e na comunicação. Esta abordagem transmite uma formação robusta aos nossos diplomados muitos dos quais são hoje profissionais de sucesso em empresas e instituições nacionais e internacionais, e.g., Critical e Critical Techworks, Continental, Sonae, Feedzai, OutSystems, Google, Meta, Microsoft.
PA: Já ao nível da investigação, quais os projetos ou áreas de investigação que assumem maior relevância no panorama científico do DCC?
Fernando Silva: Como referido, os docentes do departamento desenvolvem a sua investigação em unidades de investigação num vasto número de subáreas das quais destacamos: teoria da computação, linguagens de programação, redes complexas, inteligência artificial e análise de dados, aprendizagem automática, extração de conhecimento, visão computacional, computação paralela e distribuída, criptografia, segurança e privacidade, “cloud computing”, redes, internet das coisas, informática na saúde e computação gráfica.
A investigação desenvolvida tem uma forte componente de aplicação, normalmente associada a projetos nacionais ou europeus, como é o caso da condução autónoma, cidades inteligentes, cibersegurança, saúde inteligente, compreensão de narrativas, deteção de notícias falsas, diagnóstico médico assistido por computador, saúde personalizada e sistemas críticos.
O reconhecimento da competência científica existente fica bem patente em alguns exemplos concretos, tal como na área de segurança e privacidade, com a liderança do Centro de Competências em Cibersegurança da UPorto e a colaboração do Prof. Luís Antunes, como Representante Português no Committee on Digital Economy Policy, Organisation for Economic Co-operation and Development. Por sua vez, o Prof. Alípio Jorge coordenou a definição da Estratégia Nacional para a Inteligência Artificial, AI Portugal 2030.
O DCC tem tido um forte compromisso com a transferência de tecnologia, sendo muitos os exemplos de “start-ups” e “spin-offs” da responsabilidade de docentes e de ex-estudantes do Departamento. São disso exemplo, a Didimo, que desenvolve tecnologia que permite criar avatares digitais de alta fidelidade em apenas 30 segundos, a partir de uma fotografia. A Ethiack criada pelo mestre de segurança informática André Batista, apontado como um dos hackers mais valiosos do mundo, é outro exemplo de sucesso recente. A TekPrivacy, que desenvolve tecnologia potenciadora da privacidade tendo recentemente passado à segunda fase do programa EiC Accelerator. A Adyta com vários projetos de I&D em comunicações seguras e segurança post-quantum, em colaboração com o Gabinete Nacional de Segurança. A Geolink especializou-se na optimização da operação de frotas automóveis, sendo referência na expedição eletrónica de táxis em Portugal.

PA: O DCC organiza e participa em competições de programação nacionais e internacionais, com bons resultados. Qual é o impacto destas competições na formação e motivação dos alunos?
FS: Desde 1999, o DCC tem dinamizado equipas de estudantes dos seus cursos, ou mesmo de toda a Universidade, para participarem em competições de programação internacionais promovidas pelo ICPC (International Collegiate Programming Contest). Estas são competições que promovem competências a nível de algoritmia, resolução de problemas de forma eficiente, trabalho em equipa com limitação de tempo. Trata-se de habilitações diferenciadoras para os estudantes nomeadamente, mais tarde, em contexto laboral.
As equipas promovidas pelo DCC, participam na prova regional dos países do sudoeste da Europa (SWERC) e no europeu (EUC) que apuram para as finais mundiais. As nossas equipas qualificaram-se por três vezes para as finais mundiais, um feito único a nível nacional e que é fruto do trabalho desenvolvido na nossa formação. O DCC esteve na origem, em 2001, do concurso MIUP (Maratona Inter-Universitária de Programação) e do ToPAS dirigido a estudantes pré-universitários. O DCC é ainda responsável pela preparação das Olimpíadas Nacionais de Informática e pela seleção dos estudantes pré-universitários que vão representar Portugal às Olimpíadas Internacionais de Informática.
De entre os estudantes que participaram nas nossas equipas, muitos são hoje professores universitários, inclusive fora do país — e.g., Universidade de Princeton, nos Estados Unidos — enquanto vários outros trabalham para empresas como a Microsoft, Meta ou Google.
PA: A atual direção do Departamento de Ciência de Computadores iniciou funções há relativamente pouco tempo. Quais são as principais prioridades definidas para o próximo ano letivo?
FS: O DCC cresceu muito nas áreas de formação que estão sob sua responsabilidade. Um dos principais objetivos da atual direção é conseguir as condições adequadas ao bom funcionamento dos cursos, nomeadamente ao nível da equipa docente, dos técnicos de apoio administrativo e laboratorial, assim como dos espaços físicos de apoio às aulas. Há cerca de 5 anos, a UPorto fez uma aposta estratégica na área de informática, envolvendo os dois departamentos da área — o DCC e o DEI (Departamento de Engenharia Informática) –, ao ponto de hoje, em conjunto, termos mais de 3000 estudantes a quem damos formação num dos níveis de ensino. Urge que a UPorto dê o próximo passo concretizando a construção de um edifício, onde os dois departamentos possam coexistir e cooperar no sentido de prestarem ainda melhor serviço de formação e investigação na área de informática.
A informática é, hoje, uma área que se interliga e potencia muitas outras áreas do conhecimento, mesmo áreas fora das Ciências e Engenharias, nomeadamente Medicina, Economia, Desporto, Direito, entre outras. Importa, por isso, assegurar os meios necessários para que estas ligações sejam possíveis e fortalecidas, favorecendo desenvolvimentos transdisciplinares na investigação e na formação dentro da Universidade.