População do Alto Alentejo beneficia de cuidados de saúde de Proximidade

No Alto Alentejo, a saúde apresenta outras prioridades comparando com os grandes polos de urbanização. Com uma população reduzida, envelhecida e dependente, a Unidade Local de Saúde do Alto Alentejo (ULSAALE) foca-se num serviço ao domicílio e na prestação de cuidados de saúde de proximidade. Nesta entrevista à Perspetiva Atual, contamos com o testemunho de vários profissionais da equipa médica.

Perspetiva Atual: Comecemos por conhecer a vossa área de atuação. A ULS do Alto Alentejo cobre que unidades hospitalares e presta que serviços clínicos?

Joaquim Araújo – Presidente do Conselho de Administração: A ULSAALE assegura, praticamente, toda a prestação de cuidados de saúde do distrito de Portalegre, existindo polos de medicina privada, que realizam essencialmente consultas e MCDT (Meio Complementar de Diagnóstico e Terapêutica), sendo que a ULSAALE detém acordos com alguns deles para a realização de MCDT, existindo assim uma complementaridade.

“Pretendemos proporcionar aos utentes da ULSAALE os cuidados clínicos adequados, na altura certa e no local certo (…) mas privilegiando sempre o domicílio e a prestação de cuidados de saúde de proximidade.”

A ULSAALE é constituída por 2 unidades hospitalares (Portalegre e Elvas) e 16 centros de saúde (um em cada concelho do distrito, exceto Ponte de Sor que tem 2, Ponte de Sor e Montargil), abarcando uma área geográfica de aproximadamente 6.000 Km², com uma baixa densidade populacional e altos índices de envelhecimento e de dependência.

As condições sociogeográficas da instituição, contribuem negativamente na capacidade de atratividade de profissionais de saúde, situação esta que impacta transversalmente no desenvolvimento organizacional. A estrutura de custos da instituição é influenciada negativamente por todas estas condicionantes, verificando-se ainda uma grande dificuldade na obtenção de economias de escala.

A instituição, na sua matriz assistencial, encontra-se organizada numa estrutura departamental, existindo 7 departamentos assistenciais, 6 de âmbito hospitalar e 1 de cuidados de saúde primários, existindo ainda 2 serviços (consulta externa) e 5 unidades funcionais, que não dependem de nenhum departamento.

PA: Qual é o principal papel da ULS como instituição?

Joaquim Araújo: A Missão da ULSAALE, E.P.E. consiste na prestação integrada e personalizada de cuidados de saúde a todos os cidadãos, garantindo uma resposta adequada, de qualidade, em tempo útil, com rigor técnico-científico e com respeito pela dignidade humana. Promove a confiança dos colaboradores e utentes, na procura contínua de soluções que reduzam a morbilidade e permitam obter ganhos em saúde.

PA: Em contexto de investigação, que projetos se encontram em curso e para que tipo de tratamentos?

Joaquim Araújo: Temos uma quantidade muito elevada de projetos de investigação sob a tutela da nossa Divisão de Formação, Investigação e Documentação. Participámos e organizamos eventos científicos, dando corpo a este dinamismo na procura do conhecimento.

 PA: Falando da mais recente novidade: a Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano passou a chamar-se ULS do Alto Alentejo. Que mudanças se fizerem sentir e quais os benefícios desta mudança de designação para os profissionais e utentes?

Joaquim Araújo: Para além da alteração da denominação propriamente dita, outras questões se punham, tendo sido e só possível com o processo de constituição das ULS e que decorreu em todo o país.

Apesar de ter sido estabelecido esta organização dos serviços por razões históricas (esta unidade local de saúde foi a segunda no país e a primeira de base distrital), o certo é que tal factualidade foi controversa e alvo de grandes constrangimentos, quer do ponto de vista formal, quer funcional, em termos de operacionalização e de articulação, complementaridade e efetividade da prestação de cuidados de saúde.

Importa ainda salientar que esta tipologia de organização não encontrava paralelo em qualquer outra Unidade Local de Saúde, tendo estas na sua organização, a responsabilidade pelas atividades de saúde pública, bem como o respetivo laboratório.

PA: Que tipo de abordagem clínica a ULS adota com os seus utentes?

Diretora Clínica dos Cuidados de Saúde Primários – Ana Briosa: A abordagem clínica que a ULSAALE adota com os seus utentes é a de integração de Cuidados de Saúde prestados pelos Hospitais e Centros de Saúde, de modo a otimizar o percurso dos doentes pelos diferentes níveis de cuidados. Pretendemos proporcionar aos utentes da ULSAALE os cuidados clínicos adequados, na altura certa e no local certo, seja ele o Centro de Saúde, o Hospital, as Unidades de Cuidados Continuados, Unidades de Paliativos, e até ERPI(s), mas privilegiando sempre o domicílio e a prestação de cuidados de saúde de proximidade. Sabemos que a fragmentação dos Cuidados de Saúde prejudica particularmente os idosos frágeis e os doentes com doença crónica, que têm o peso mais significativo na nossa população e uma relação intensa com o SNS, necessitando de diferentes especialistas e profissionais durante o seu percurso de vida.

 Apesar da carência de recursos humanos, com a saída e reforma de muitos profissionais, consideramos que o desempenho e os resultados em saúde que temos atingido são bons. Claro que queremos melhorar e contamos também com os recursos sociais e da comunidade que são imprescindíveis e que têm vindo a articular e a aprofundar essa articulação com a ULSAALE.

“(…) almejamos assegurar cuidados de proximidade numa região extensa, marcada por infraestruturas viárias deficientes e uma população com índices de envelhecimento e dependência entre os mais altos da Europa”

PA: Que tipo de abordagem clínica a ULS adota com os seus utentes?

Diretora Clínica Hospitalar – Vera Escoto: A Missão da ULS AALE, E.P.E. é a prestação integrada e personalizada de cuidados de saúde a todos os cidadãos, garantindo uma resposta adequada, de qualidade, em tempo útil, com rigor técnico-científico e com respeito pela dignidade humana, promovendo a confiança dos colaboradores e utentes, na procura contínua de soluções que reduzam a morbilidade e permitam obter ganhos em saúde.

No cumprimento da nossa missão e visão, almejamos assegurar cuidados de proximidade numa região extensa, marcada por infraestruturas viárias deficientes e uma população com índices de envelhecimento e dependência entre os mais altos da Europa.

 Desta forma é extremamente vulnerável e dependente do Serviço Nacional de Saúde (SNS), como o seu principal prestador de cuidados de saúde. Para cumprir sua missão e visão, a ULSAALE, E.P.E. orienta as suas ações com o propósito de alcançar os seguintes objetivos:

  • Contribuir para a obtenção de ganhos em saúde na população;
  • Promover a vigilância da saúde, a prevenção e o diagnóstico da doença e o tratamento e a reabilitação do utente, através do planeamento e da prestação de cuidados, bem como do desenvolvimento de atividades específicas dirigidas globalmente ao indivíduo, à família, a grupos especialmente vulneráveis e à comunidade;
  • Garantir a humanização dos cuidados e os direitos dos utentes; Promover o acesso e a adequação da oferta de serviços;
  • Assegurar a eficiência técnica e económica; Garantir a qualidade dos cuidados e da organização dos serviços;
  • Valorizar o capital humano, assegurando a formação contínua aos seus profissionais;
  • Assegurar a plena integração dos níveis de cuidados de saúde em todas suas dimensões;
  • Promover a inclusão do utente no processo da tomada de decisão dos cuidados de saúde adequados à situação clínica de cada um.

“Temos evoluído como equipa. Promovemos já a prestação de cuidados através de um processo clínico informatizado, cada vez com mais qualidade e coerência, o que melhora muito a partilha de informação clínica (…)”

PA: A ULS do Alto Alentejo promove e dinamiza diversas ações com os mais novos, alunos da área da saúde, idosos, entre outros utentes. Fale-nos um pouco destas ações e quais os seus principais objetivos.

Enfermeiro Diretor – Jorge Marques: A ULS, através das UCC que tem implementadas em todos os centros de saúde, desenvolve ações de promoção para a saúde, quer nas escolas, quer nas estruturas residenciais para pessoas idosas, quer noutras estruturas comunitárias. Essas ações visam o autocuidado e as atividades promotoras de estilos de vida saudável, e de prevenção da doença. Entre outras, desenvolvem-se ações de promoção da higiene oral, promoção do exercício físico, prevenção do tabagismo e do consumo de álcool e outras dependências, entre outras ações. As ações contam com as parcerias das entidades dentro dos estabelecimentos ou que fazem a sua gestão.

PA: Como é que descreveria a equipa de saúde e, de que forma, o seu trabalho tem contribuído para a evolução dos cuidados de saúde?

 Ana Briosa: A equipa de saúde da ULSA ALE é constituída por todo e qualquer funcionário desta ULS. São todos imprescindíveis para a prestação de bons cuidados de saúde e temos consciência que as instituições, os serviços e os profissionais a trabalhar isoladamente não conseguem cobrir as necessidades dos utentes. 

Os cuidados hospitalares e os cuidados de saúde primários têm vindo a desenvolver a partilha de conhecimentos e o trabalho conjunto, também a Saúde Pública e com a Rede Nacional de Cuidados Integrados.

Temos a noção que uma ULS não pode ser meramente a fusão entre instituições, tem de haver partilha de responsabilidades e recursos tanto humanos como materiais.  Temos evoluído como equipa. Promovemos já a prestação de cuidados através de um processo clínico informatizado, cada vez com mais qualidade e coerência que melhora muito a partilha de informação clínica, estamos a melhorar os critérios de referenciação entre diferentes níveis de cuidados e de profissionais, a tirar cada vez mais partido do potencial tecnológico e a prestar mais serviços de especialidade e meios complementares de diagnóstico descentralizados e de proximidade.

A Equipa de Saúde tem sido dinâmica e tem conseguido ultrapassar as resistências à mudança que são sempre normais e acontecem. Já somos Unidade Local de Saúde há muitos anos, mas o nosso objetivo é sermos dinâmicos, inovadores e melhorar.

“A prática da telemedicina e das teleconsultas foi sempre uma estratégia eficaz nesta instituição para melhorar o acesso aos cuidados de saúde (…)”

 Vera Escoto: A Visão da ULSAALE, E.P.E. consiste em ter uma imagem de excelência na área da saúde, no respeito pelo primado da complementaridade, em todos os níveis de cuidados de saúde, dada a sua multidisciplinaridade terá de promover a sua interdisciplinaridade para melhor cuidar.

 Em primeiro lugar a inovação:

– A prática da telemedicina e das teleconsultas foi sempre uma estratégia eficaz nesta instituição para melhorar o acesso aos cuidados de saúde, reduzindo os impactos da sua localização remota.

– A hospitalização domiciliaria, revolucionou o conceito tradicional de internamento, trazendo benefícios significativos para a saúde dos cidadãos e promovendo uma abordagem mais humanizada nos cuidados.

– A implementação das equipas comunitárias de saúde mental, cuidados paliativos assim como a descentralização das consultas hospitalares para os Centros de Saúde têm promovido uma maior proximidade no acesso aos cuidados de saúde mental. Isso traduz-se numa melhor integração dos profissionais de saúde dos diversos níveis de cuidados, garantindo cuidados mais próximos e eficazes às necessidades da comunidade.

– Somos parceiros colaborativos no Centro de Investigação do Alentejo (CTrail) facilitando a realização de projetos de pesquisa, estabelecendo uma ligação crucial entre os profissionais de saúde da ULS e a academia. Essa colaboração tem levado a uma expansão significativa do conhecimento e à retenção de profissionais qualificados na região.

– A ULSAALE, ao ser parceira da comissão instaladora para a criação do futuro curso de medicina da Universidade de Évora – denominado Alentejo M.D. – abrirá portas para a formação de jovens médicos desta região, onde anteriormente seria uma miragem pensar em alcançar tal objetivo. Essa colaboração é estimulante para os nossos profissionais, pois permite-nos colaborar como instituição parceira nas diferentes áreas letivas. Criamos uma vontade coletiva das várias ULS e a Universidade, estando convictos que no futuro fixará e captará jovens talentos que tanta falta fazem nesta região.

– Foi implementado um sistema de mensagens informativas por SMS, fornecendo atualizações sobre o estado do utente no pós-operatório e durante o atendimento no serviço de urgência, direcionadas aos familiares ou acompanhantes.

– Introdução de quiosques na área de consulta externa, visando garantir a confidencialidade das informações dos utentes. São dispositivos destinados à gestão das consultas e exames de forma autónoma pelos utentes.

Em segundo lugar, a melhoria do acesso aos cuidados hospitalares:

– Promoveu-se o aumento dos cuidados cirúrgicos ambulatórios que representa uma melhoria significativa no acesso aos serviços de saúde, tanto para condições clínicas benignas quanto malignas.

– Ampliação da variedade de consultas especializadas oferecidas aos utentes

– Otimização das listas de espera de consultas e cirurgias.

– A contratação de especialistas em áreas especificas, como psiquiatria infantil e anatomia patológica, ajudou a responder às necessidades dos utentes nestas áreas tão cadenciadas

– Instalação de novo equipamento de Ressonância Magnética (RM) no HDJMG. Esta medida contribui não só para melhorar os serviços oferecidos aos utentes em regime de internamento, mas também reforça a capacidade no atendimento dos utentes dos CSP.

PA: Que plano estratégico e objetivos a administração da ULSAALE definiu para este ano 2024?

Joaquim Araújo: A ULSALE, EPE, tal como outras instituições do SNS, aposta essencialmente na melhoria da oferta de serviços, com mais qualidade e segurança. Nesse sentido, tem para 2024, uma série de projetos, totalizando um investimento significativo em infraestruturas e tecnologia diferenciada que permita atingir estes objetivos. Concluímos recentemente a instalação de um equipamento de Ressonância, temos os projetos do Plano de Recuperação e Resiliência em curso, fomos recentemente reforçados com montantes significativos, nesse domínio, pela inclusão de novos centros de saúde e esperamos concluir, no final do ano, a nova Unidade de Cuidados Intensivos. Temos também investimentos e objetivos a atingir no que concerne a técnicas assistenciais e processos organizativo dos mesmos, abordagens muito diferenciadoras, não descurando a segurança e a realidade em que nos inserimos.

“(…) Se não fosse esta forma de prestação de cuidados proporcionada pelo modelo ULS, a resposta à pandemia de covid-19 no distrito de Portalegre teria sido outra, certamente menos favorável para as nossas populações.”

 PA: Como presidente do conselho de administração, o que perspetiva quanta a estas ULS e que futuro espera para a do Alto Alentejo?

Joaquim Araújo: Acreditamos muito nesta forma de resposta às necessidades de saúde! Nós fizemos aqui um trabalho significativo para que o projeto pudesse ter sucesso! Podemos acrescentar que, se não fosse esta forma de prestação de cuidados proporcionada pelo modelo ULS, a resposta à pandemia de covid-19 no distrito de Portalegre teria sido outra, certamente menos favorável para as nossas populações. O facto de sermos uma Unidade Local de Saúde permitiu que a estratégia de combate a implementar tivesse sido mais efetiva, minorando as suas consequências.

Contudo, antes da crise da COVID-19 ter surgido, nós já registávamos uma boa articulação entre os vários tipos de cuidados, apoiando-nos em soluções baseadas em tecnologias de informação. A abordagem, quer assistencial quer medicamentosa, alterou-se de forma significativa, permitindo em diversas patologias uma melhor resposta, mais robusta e segura, a oferta de cuidados de proximidade, a internalização de meios de diagnóstico e a segurança na prescrição foram ganhos que não podemos desprezar.

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