DEEC: Há 50 anos a construir o futuro
Em forma de celebração dos 50 anos do Departamento de Engenharia Eletrotécnica e de Computadores da Universidade de Coimbra (DEEC), o subdiretor Paulo Menezes mostra-se orgulhoso da evolução da instituição e explica a importância deste Unidade de Ensino e Investigação da Faculdade de Ciências e Tecnologia nos dias que correm.
Perspetiva Atual: Qual é a principal função do Departamento de Engenharia Eletrotécnica e de Computadores (DEEC) da Universidade de Coimbra, qual a sua relevância nos dias de hoje e que desafios enfrenta?
Paulo Menezes: O Departamento de Engenharia Eletrotécnica e de Computadores faz parte da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Coimbra e tem como missão a formação e a investigação científica e tecnológica, numa área em constante e rápida evolução, a qual influencia o mundo atual e a forma como vivemos. Num mundo em transição, onde se procura cada vez mais a substituição das energias fósseis por renováveis, da robótica, dos carros autónomos, da computação e telecomunicações integradas no nosso dia a dia, a Engenharia Eletrotécnica e de Computadores tem um papel cada vez mais relevante. Na realidade, podemos dizer que tendemos para uma sociedade onde tudo o que fazemos depende de aplicações de eletricidade e dos computadores. Não temos atualmente outra forma tão eficiente de controlar processos, que vá das escalas sub-microscópicas até grandes dimensões, que não passe pela utilização de princípios elétricos e sua automatização com recurso aos computadores, também eles eletrónicos. Claro que isto potencia um sem-número de afinidades com outras áreas do saber. A integração na Faculdade de Ciências e Tecnologia e na própria Universidade de Coimbra permite aos nossos investigadores explorar as relações de proximidade com os vários departamentos e faculdades. Além disso, permite também aos nossos alunos o envolvimento em projetos multidisciplinares.
PA: Quais são os maiores desafios que enfrentam atualmente?
PM: As dificuldades que enfrentamos, e que de alguma forma podem restringir esta capacidade de inovação, prendem-se basicamente com a impossibilidade de reforço e renovação dos recursos humanos, por limitações das políticas orçamentais. Ainda assim, devo realçar a excelência tanto na investigação científica que é comprovada pelos resultados obtidos, como na qualidade de formação dos nossos estudantes que é atestada pela sua fácil integração no mercado de trabalho e os elevados cargos atingidos na sua vida profissional.
PA: A nível de oferta formativa, o Departamento já conta com os três níveis de ensino superior. Quais são os cursos que constituem a vossa formação?
PM: A nossa oferta formativa centra-se nos cursos de licenciatura (LEEC), mestrado (MEEC) e doutoramento (DEEC) em Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, além da participação em diversos outros cursos. Tanto a Licenciatura, como o Mestrado atuais, seguem planos de estudos criteriosamente definidos para facilitar tanto a integração no mercado de trabalho, como a progressão para ciclos de estudos seguintes. Podemos dizer que tal como estão desenhados os planos de estudos, os estudantes não só aprendem a fazer, como sabem porque o estão a fazer. Na realidade procuramos que a formação que damos aos nossos alunos lhes permita continuarem relevantes quando parte da tecnologia que usamos hoje vier a ser substituída por uma completamente diferente, como tem acontecido ao longo das últimas décadas.
Há uma característica interessante nos planos de estudos do LEEC que é a existência de disciplinas opcionais, onde os alunos podem escolher as que mais se adequam aos seus objetivos. No caso do MEEC isto vai mais longe pois este divide-se em 4 especializações e por conjugação das disciplinas opcionais os estudantes podem ainda obter uma ou duas subespecializações, as quais constarão no diploma emitido pela UC.
PA: Falou da fácil integração dos alunos no mercado de trabalho, podemos afirmar que, atualmente, o DEEC tem uma percentagem positiva de empregabilidade?
PM: Sem dúvida, se tal fosse possível poderíamos dizer que a taxa de empregabilidade ultrapassa 100%, pois muitas empresas procuram atrair os nossos estudantes mesmo antes destes terminarem os seus estudos.
Isto é claramente muito interessante e motivador para qualquer jovem que pensa em tirar um curso superior sem ter de se preocupar com problemas de empregabilidade. Podemos mesmo dizer que os nossos estudantes, quando terminam a sua formação, encontram tantas oportunidades a nível nacional como internacional, que a dificuldade é em escolher em qual pretendem iniciar a sua carreira profissional. Na realidade eu arrisco a dizer que uma das melhores escolhas que um jovem pode fazer ao entrar para o Ensino Superior é optar por um curso de Engenharia dado que, atualmente, as empresas são obrigadas a competir entre si para conseguir contratar os Engenheiros de que necessitam.
PA: O DEEC mantém parcerias com algumas unidades de investigação. Neste momento, estão envolvidos em algum projeto de investigação?
PM: O DEEC mantém uma forte ligação com quatro unidades de investigação – ISR, IT, INESCC e CEMMPRE – de elevado prestígio reconhecido a nível internacional. Esta ligação ensino-investigação permite que os professores, estando constantemente envolvidos em projetos de investigação e desenvolvimento com a indústria e/ou com outros parceiros académicos nacionais e internacionais, se mantenham sempre a par dos mais recentes desenvolvimentos científico-tecnológicos das áreas em que trabalham.
Por exemplo, na área da saúde, temos trabalhos como a telemedicina assistida por robôs, o mapeamento do trato digestivo por cápsulas endoscópicas, ou ainda a eletrónica flexível que se ajusta aos contornos do corpo e seus movimentos. Na área da computação temos trabalhos que vão desde o desenvolvimento de sistemas computacionais desenhados por medida e de muito baixo consumo, aos sistemas computacionais de alto desempenho. Na área da energia e transportes há projetos de sistemas que permitem aos veículos elétricos carregar as baterias em movimento através de sistemas de indução instalados nas estradas e que fazem o carregamento através de novas gerações de pneus, ou em sistemas de tração mais eficientes e tolerantes a falhas que contêm motores que se reconfiguram após um curto-circuito num dos enrolamentos, tornando-se assim mais seguros para equipar, por exemplo, atuadores de leme ou do trem de aterragem de aviões. Poderíamos continuar e enumerar muitos mais, mas dado que estamos numa era de envelhecimento populacional, termino referindo um conjunto de projetos que temos vindo a desenvolver no campo dos robôs e sistemas interativos que, estando sempre atentos ao utilizador, permitem que a comunicação possa ser natural e envolvendo a fala, gestos, ou simplesmente um olhar. Tal como um animal de estimação, um robô auxiliar deve ser capaz de reconhecer o seu mestre pela aparência e pela voz, mas também avaliar o seu estado emocional através da expressão facial, tom de voz, ou pela forma como se movimenta. Tudo isto só pode ser conseguido à custa da gestão adequada dos recursos computacionais, das comunicações, dos algoritmos de fusão sensorial, aprendizagem e inferência, e dos consumos energéticos associados por forma que tais sistemas sejam simultaneamente suficientemente poderosos e autónomos para serem realmente úteis.
PA: O DEEC está a completar 50 anos de existência. Em 50 anos existe muito espaço para evolução. Qual é o balanço que faz do desenvolvimento do Departamento ao longo destes últimos anos?
PM: O DEEC, desde a sua génese, procurou sempre contribuir para a boa formação dos seus alunos e aproximá-los daquilo que é, ou virá a ser muito provavelmente, o último grito da tecnologia para que estes, enquanto profissionais, tenham as ferramentas necessárias para se adaptarem às mudanças tecnológicas e não se sentirem como “iogurtes fora de prazo”. Assim, ainda no final da década de 70 e inicio dos anos 80, foram introduzidos, tanto a nível da investigação como do ensino, temas como a computação, a robótica e a visão por computador, tomando claramente uma posição de vanguarda a nível nacional.
No que diz respeito à evolução recente, temos acompanhado e contribuído para o desenvolvimento de novos paradigmas da computação como os sistemas ultra-paralelos (multicore e GPUs), de baixo consumo e reconfiguráveis (FPGAs), vestíveis e maleáveis. Na robótica temos desenvolvido algoritmos de controlo que permitem transformar o típico robô industrial em robôs colaborativos, ou de apoio à cirurgia e ao diagnóstico. Temos os robôs móveis sociais que integram novas capacidades de interação só possíveis graças ao desenvolvimento que temos vindo a fazer em diferentes áreas como o reconhecimento de lugares, pessoas e objetos através das redes neuronais profundas. Na visão artificial desenvolvemos novas metodologias que permitem por exemplo criar modelos de cidades mais compactos dos que os tradicionalmente gerados por tecnologia de LIDAR, ou a fusão de imagens capturadas por cápsulas endoscópicas ao longo do seu trajeto pelo aparelho digestivo para criar uma representação que possa ser interpretada pelos médicos.
Muitos outros temas foram objeto de estudo e contribuição. Um exemplo é o conceito de videotelefone desenvolvido na década de 80 dando origem a publicações e protótipos que demonstraram a possibilidade de vir a ter estes dispositivos nas nossas casas. Graças à evolução da eletrónica que permite criar sistemas cada vez mais poderosos e com consumo energético cada vez mais reduzido, temos hoje estas funcionalidades na palma das mãos.
Em termos de ensino, a evolução também aconteceu de forma marcante, tanto através da reformulação dos currículos como dos métodos de ensino, como já referido.
PA: Se tivesse que apresentar o DEEC a potenciais futuros alunos, quais seriam os pontos que destacaria?
PM: A Licenciatura em Engenharia Eletrotécnica e de Computadores da Universidade de Coimbra baseia-se num novo currículo que, sem descurar a aprendizagem dos conceitos teóricos fundamentais, inclui uma forte componente prática. Isto é normalmente o sonho de qualquer jovem e damos tanta importância a este aspeto, que mesmo a avaliação deixou de ser feita apenas através de exames finais, mas também pelo desenvolvimento de trabalhos práticos, cujo objetivo é fomentar a aprendizagem “fazendo” e dando espaço à criatividade.
Para atingir estes objetivos, os alunos contam ainda com duas disciplinas de projeto, no segundo e terceiro anos da licenciatura, onde são desafiados a desenvolver aplicações reais. No mestrado mantém-se este conceito e é dada a oportunidade ao estudante de se aproximar dos laboratórios de investigação para realização dos trabalhos finais, sempre em torno de temas de grande atualidade, e que têm como objetivo a resolução de problemas de aplicação real. Assim, os nossos alunos recebem uma preparação de excelência para enfrentarem os desafios do mercado de trabalho. Podemos orgulhosamente dizer que os nossos alunos reportam que, embora muitas vezes inseguros quando iniciam o primeiro emprego, rapidamente descobrem que se sentem perfeitamente preparados para esta etapa de adaptação.
PA: 50 anos é uma daquelas marcas que nos deixa sempre a pensar no futuro. Quais são os grandes objetivos desta direção para o futuro do Departamento?
PM: É verdade, tendo chegado até aqui com esta energia e vitalidade, sentimos a responsabilidade de contribuir para que o futuro do DEEC e dos seus estudantes seja ainda mais empolgante e promissor.
Nestas últimas décadas muita coisa mudou e a tecnologia veio permitir que as pessoas estejam sempre ligadas, embora muitas vezes nem sequer tenhamos consciência sobre ao quê ou a quem estamos realmente ligados.
No DEEC temos como desafio a adaptação a esta nova realidade e, depois de dois anos com aulas online, estamos mais do que preparados para o fazer quando necessário e não excluímos a hipótese de virmos a ter aulas no tão falado metaverso. No entanto, temos vindo a trabalhar para que os nossos estudantes tenham cada vez melhores condições para estudarem no DEEC, dentro e fora das aulas. Isto é particularmente importante pois sabemos que nem sempre os sítios onde vivem têm as condições ideais para as horas de estudo necessárias. Estamos também a criar condições para favorecer o trabalho em grupo, cada vez mais importante para as empresas.
Os laboratórios estão a ser equipados com a tecnologia mais recente para que desde cedo os estudantes dela possam usufruir através do contacto nas aulas ou fora delas, através de acesso online. Isto permite que um aluno possa preparar ou repetir uma experiência ou trabalho prático mesmo a partir de suas casas, com equipamentos específicos e que dificilmente poderiam ter acesso doutras formas. Uma outra vertente é a da internacionalização do ensino, fomentando o contacto com estudantes e professores doutras universidades estrangeiras, bem como a criação de uma relação de proximidade com empresas tecnológicas. Isto permitirá aos nossos estudantes desenvolverem um melhor conhecimento da realidade da EEC a nível nacional e internacional e, por consequência, uma melhor preparação para as suas escolhas no futuro.