Samuel Lopes, Diretor do CMUP e Helena Reis, Vice-diretora do CMUP

“Consistência e competência da investigação” levam ao sucesso do CMUP

Samuel Lopes, Diretor do Centro de Matemática da Universidade do Porto (CMUP), partilha as características que levaram o CMUP a alcançar a classificação de “Excelente”, atribuída pela FCT, e explica a importância do estudo das diferentes variantes da matemática para o dia a dia da sociedade e para os diferentes ramos profissionais.

Perspetiva Atual: O Centro de Matemática da Universidade do Porto (CMUP) está entre os principais e mais reputados centros de investigação em Portugal. Qual é a sua principal missão?

Professor Samuel Lopes: O CMUP tem uma história e um percurso bem alicerçados no sistema científico nacional, sendo reconhecido desde 2004 por todos os painéis internacionais de avaliação formados pela FCT como “Excelente”, tendo obtido resultados particularmente singulares na última avaliação. Este sucesso explica-se pela consistência e competência da investigação desenvolvida neste Centro, que alberga investigadores que lideram na sua área, pela abrangência com que a Unidade desenvolve conhecimento em diversos domínios da Matemática, pelo modo como o notável trabalho de cariz fundamental (aquele que é mais centrado nos aspetos predominantemente teóricos e fundamentais do saber) tem sido complementado com o renovado fôlego atribuído também à investigação de natureza aplicada e à inovação. Todos estes fatores granjearam ao CMUP uma posição privilegiada de referência na investigação em Matemática no panorama nacional e internacional.

A missão primeira do CMUP é a criação de condições para que os seus membros e grupos de investigação possam realizar investigação científica de topo na área da Matemática e suas aplicações, incluindo áreas como Ciência dos Dados e Inteligência Artificial. Este propósito assenta em estratégias de internacionalização, interdisciplinaridade e potenciação de sinergias, divulgação da ciência e, claro, formação de investigadores e equipas em todos os patamares de profissionalização, desde os estudantes, os bolseiros de iniciação à investigação, pós-doutorados e investigadores de carreira de níveis júnior e sénior.

Sobre o CMUP
Fundado em 1942 por Ruy Luís Gomes, há sete décadas que esta unidade de I&D tem proporcionado incalculáveis contributos para a produção de conhecimento e para o avanço das ciências matemáticas em Portugal e no mundo. Tal é um aspeto que se evidencia pelo amplo currículo académico de um corpo de investigadores integrados, no qual se incluem vários elementos do corpo editorial de revistas científicas. 
Igualmente notória é a inovação subjacente à lógica organizacional deste centro de investigação, assente numa estrutura onde quatro pilares da Matemática — Álgebra; Análise; Geometria; Probabilidade e Estatística — coexistem com o funcionamento de quatro linhas de investigação: Matemática Computacional; Sistemas Dinâmicos; Modelos Matemáticos e Aplicações; Semigrupos, Autómatos e Linguagem, que definem a sua peculiaridade.
Ainda que fundamental na sua essência, o trabalho científico desenvolvido pelo CMUP tem encontrado um crescente potencial de aplicabilidade junto de empresas ou entidades de setores tão díspares quanto as Ciências Farmacêuticas, a Economia ou a Medicina. 

PA: O CMUP promove e apoia algum tipo de programa de formação pós-graduada?

SL: O renome do CMUP permite atrair estudantes internacionais de grande potencial para os quatro programas doutorais que apoia, nomeadamente o Programa Interuniversitário de Doutoramento em Matemática (PIUDM), em colaboração com a Universidade de Coimbra, o Programa de Doutoramento em Matemática Aplicada (PDMA), em colaboração com as Universidades de Aveiro e do Minho, o Programa Doutoral em Ciências de Computadores (PDCC) e o novo programa de Doutoramento em Matemática e Aplicações (PDMAPLI), envolvendo as Universidades do Porto, Minho e Trás-os-Montes e Alto Douro—universidades do Norte de Portugal—e as Universidades da Corunha, Santiago de Compostela e Vigo—universidades da Galiza. Este programa tenta potenciar a afinidade cultural entre estas regiões transfronteiriças, agregando competências científicas muito variadas de docentes e investigadores com reconhecimento internacional em Matemática e as suas aplicações. Os melhores estudantes destes programas são apoiados com bolsas de investigação e recursos que permitem participar em encontros científicos e estadias de investigação em centros internacionais.

O CMUP apoia também mestrados da Universidade do Porto na área da Matemática, nomeadamente atribuindo bolsas de investigação aos estudantes mais ativos e, de forma mais indireta, às Licenciaturas em Matemática e Matemática Aplicada, disponibilizando recursos e apoio científico ao grupo iNIGMA de alunos de Matemática da Universidade do Porto.

PA: Além de contar com 67 investigadores integrados doutorados, o CMUP conta com estudantes de mestrado e doutoramento?

SL: Temos mais de 30 membros estudantes, maioritariamente auferindo bolsas de investigação. Essas bolsas contam com a orientação científica de membros experientes do CMUP que iniciam e supervisionam estudantes nos seus trabalhos de investigação científica. Em geral, são estudantes com muito bom rendimento académico, dinâmicos e aptos para iniciarem um percurso com maior autonomia, quer seja em investigação de cariz mais académico ou em paralelo com um projeto de investigação aplicado e interdisciplinar.

PA: O CMUP tem também uma grande reputação internacional. Com que instituições e investigadores têm parcerias?

SL: O CMUP tem parcerias internacionais com instituições congéneres de excelência espalhadas pelo mundo, incluindo Brasil, EUA, Canadá, Reino Unido, França, Espanha, Itália e Alemanha.

PA: Quais são os projetos de pesquisa que estão a ser desenvolvidos neste momento?

SL: Temos vários projetos em desenvolvimento, dos quais se destacam três pelo seu carácter multidisciplinar e potencial de aplicabilidade:

– Estudo do comportamento estatístico de sistemas caóticos, tanto em termos médios, como em eventos extremos. Em muitas situações, fenómenos erráticos podem ser modelados por sistemas dinâmicos, como os que surgem ligados à meteorologia e consequentes acontecimentos raros: inundações, secas e fogos florestais, o que traz um interesse especial ao assunto pelo seu potencial de aplicação em muitas situações práticas.

– O CMUP integra o Laboratório Associado de Sistemas Inteligentes (LASI), um consórcio de unidades de investigação com especialização em inteligência artificial e ciência de dados, indo desde as suas fundações teóricas até à sua aplicação prática.

A contribuição do LASI é baseada na perceção das pessoas como atores ativos do ecossistema tecnológico, integrando uma sociedade mais inovadora, sustentável, inclusiva e interligada. Tal permitirá a produção de avanços significativos em domínios como a administração pública, transportes inteligentes, energia verde, saúde pública e bem-estar, e conceber soluções inovadoras visando a melhoria da qualidade de vida de cada cidadão, em harmonia entre inteligência humana e artificial.

– O CMUP, em parceria com as unidades de I&D GreenUPorto, ICT e SYSTEC, desenvolve inovação e sustentabilidade no campo da horticultura, tornando as cidades mais resilientes e preparadas para abastecer a crescente população urbana com produtos frescos, seguros, nutritivos e saudáveis, reduzindo a pegada de carbono. A agricultura vertical oferece uma ampla gama de oportunidades para produzir safras de qualidade e quantidade garantidas, independentemente do clima, condições do solo ou mudanças climáticas. Além disso, considera-se que esses novos sistemas de produção promovem práticas agrícolas mais sustentáveis do que a agricultura convencional devido ao uso eficiente de água, nutrientes e terra.

PA: A matemática é a ciência do raciocínio lógico e abstrato, estuda a teoria dos números, quantidades, espaços e medidas. De que forma esta ciência é essencial para o dia a dia da sociedade e qual a sua importância nos diferentes ramos profissionais?

SL: As aplicações da Matemática surgem muitas vezes tendo por base investigação fundamental que amiúde foi desenvolvida por um simples espírito de curiosidade científica e pela necessidade e apetência que o ser humano tem de sondar os limites do conhecimento, a liberdade de abstrair e pensar de forma criativa. É aqui que se cristaliza um dos maiores trunfos da Matemática, na capacidade de reconhecer e descobrir ligações aparentemente improváveis que permitem, aliadas à tecnologia adequada, produzir efeitos reais com impacto nas mais insuspeitas atividades do dia a dia, como sejam o uso de telecomunicações móveis rápidas e seguras, escutar música online, monitorizar a saúde, fazer diagnósticos, etc.

Um exemplo muito concreto é o protagonismo que os matemáticos tiveram durante o período mais crítico da pandemia de Covid-19. Nomeadamente, Óscar Felgueiras, membro do CMUP integrado no grupo de investigação em Probabilidade e Estatística, foi requisitado para colaborar com a Administração Regional de Saúde do Norte na análise de dados, o que revela o reconhecimento pelas entidades oficiais do papel da Matemática no suporte à previsão e decisão estratégica.

Outro exemplo é a Rede Portuguesa de Matemática para a Indústria e Inovação (PT-MATHS-IN), que tem como objetivo fomentar a transferência de tecnologia matemática para o contexto empresarial e industrial, proporcionando o aumento de competitividade, tanto dos grupos de investigação envolvidos, como da indústria nacional. O CMUP é um dos membros fundadores desta rede e está presente na sua direção.

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