Modelo inovador do Tratamento Domiciliário de Doenças Lisossomais expandido para todo o país

O Hospital da Senhora de Oliveira, em Guimarães, foi pioneiro em 2020 na implementação do tratamento domiciliário das Doenças Lisossomais de Sobrecarga (DLS), em Portugal. Com base neste modelo de sucesso, foi mais recentemente publicada a Norma de Tratamento Domiciliário das Pessoas com DLS, alargando o acesso a esta modalidade de tratamento a todo o país. Com mais de 400 pacientes diagnosticados, o hospital é o maior centro da Rede Europeia de Referenciação de Doenças Hereditárias do Metabolismo (MetabERN) e um dos maiores do Mundo no tratamento da Doença de Fabry.

Olga Azevedo, Coordenadora do Centro de Referência
de DLS do Hospital de Guimarães

“Os anos de experiência com o tratamento domiciliário das DLS no nosso Centro de Referência permitiram demonstrar que esta modalidade de tratamento foi um sucesso e se associou a um aumento da qualidade de vida e da satisfação dos doentes. Por este motivo, o nosso Centro de Referência trabalhou muito, nos últimos anos, no âmbito da Comissão Coordenadora de Tratamento das DLS, com a Direção Geral de Saúde (DGS), o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge e demais entidades da Saúde para que o tratamento domiciliário das DLS pudesse ser implementado a nível nacional. Este trabalho permitiu que, com base no modelo de sucesso de Guimarães, fosse mais recentemente elaborada e publicada a Norma de Tratamento Domiciliário das Pessoas com DLS, alargando o acesso a esta modalidade de tratamento aos doentes do restante território português. Assim, o tratamento domiciliário das DLS, que já estava disponível há mais de uma década em vários países da Europa, passou a estar acessível a todos os doentes portugueses, cabendo agora apenas aos Centros de Referência a operacionalização no terreno desta Norma para que a equidade de acesso à excelência de cuidados seja cumprida a nível nacional”, destaca Olga Azevedo, Médica Cardiologista e Coordenadora do Centro de Referência de DLS do Hospital de Guimarães.

Considerando o relevante impacto na qualidade de vida, a DGS, com esta norma, define a implementação de um modelo de prestação de cuidados em regime de proximidade que aumenta o conforto do doente com DLS e dos seus cuidadores, a par dos ganhos em eficiência.

Todos os utentes com DLS acompanhados em Centros de Referência ou em Centros de Tratamento de Proximidade, devem ser avaliados para realização de tratamento em regime domiciliário. Nesta Norma estão definidos os critérios para a elegibilidade de pacientes com DLS para tratamento domiciliário. Para que um doente seja considerado elegível, é necessário que cumpra cumulativamente várias condições. O paciente deve estar em fase clinicamente estável da doença, recebendo uma terapêutica que seja passível de ser administrada em regime domiciliário. O paciente não apresentou reações adversas nos primeiros 6 meses de tratamento em regime de Hospital de Dia. O paciente, ou o seu representante legal, forneceu o consentimento informado, escrito e esclarecido, manifestando a sua preferência para a realização do tratamento em casa.

Para que o tratamento domiciliário seja viável, o domicílio do paciente deve reunir condições higieno-sanitárias básicas e adequadas para a administração da terapêutica, sendo igualmente necessário que o paciente tenha acesso a um telefone ou telemóvel para poder manter contacto com a equipa da Unidade Móvel de Apoio ao Domicílio (UMAD) ou outra equipa de tratamento domiciliário similar. Em Portugal, as DLS afetam 25 recém-nascidos por cada 100 000. São um grupo de patologias raras e progressivas, caracterizadas por alta morbilidade e que atualmente incluem mais de 60 doenças causadas por mutação de genes que codificam enzimas responsáveis por degradar determinadas substâncias nos lisossomas das células do organismo.

Profissionais da Equipa da Unidade Móvel de Apoio ao Domicílio do Hospital de Guimarães que efetuam o tratamento domiciliário das DLS

De acordo com Olga Azevedo, “quando ocorre uma mutação de um desses genes, a enzima respetiva não é produzida ou tem uma atividade reduzida, pelo que o seu substrato não é degradado adequadamente e acumula-se nos lisossomas. Com o tempo, esta acumulação de substrato nos lisossomas conduz a disfunção das células, lesão dos órgãos e morbimortalidade significativa. Estas patologias afetam geralmente vários órgãos, incluindo o coração, pulmões, rins, fígado, sistema nervoso central, ossos e sistema musculoesquelético, podendo as manifestações surgir na infância, adolescência ou idade adulta. As terapêuticas desenvolvidas nos últimos anos têm permitido retardar significativamente a evolução da lesão orgânica. Um exemplo de uma DLS é a doença de Fabry, que apesar de rara é muito prevalente em Portugal, devido a um efeito fundador da doença na região de Guimarães que remonta há mais de 400 anos.” “Desde a descoberta do efeito fundador da doença de Fabry na região de Guimarães, foi possível diagnosticar e seguir mais de 55 famílias e mais de 400 doentes com esta doença rara. Esta particularidade faz do nosso Centro de Referência um dos maiores centros de doença de Fabry a nível internacional, o que nos confere uma vantagem competitiva em termos de investigação.

Por este motivo, o Centro de Referência tem dedicado muita investigação à Doença de Fabry, nomeadamente no campo da ciência básica, em colaboração com a Escola de Medicina da Universidade do Minho”, realça a Coordenadora do Centro de Referência de DLS do Hospital de Guimarães. No domínio clínico, o Hospital da Senhora de Oliveira tem contribuído para o conhecimento dos “fenótipos tardios da doença de Fabry”, assim como para a determinação da prevalência e dos preditores da doença em pacientes com Miocardiopatia Hipertrófica em Portugal. A equipa do Centro de Referência continua a investigar a área genética da doença de Fabry, a imagem cardíaca e biomarcadores, a imunogenicidade das terapêuticas de substituição enzimática, a dor neuropática, o parkinsonismo e o impacto da modalidade do tratamento domiciliário. “É fundamental continuar a investir na formação dos profissionais de saúde como forma de promover a suspeita, rastreio, diagnóstico e tratamento precoce destas doenças. O nosso Centro de Referência tem promovido várias ações de formação dirigidas aos profissionais de saúde. Destaco a iniciativa “Fabry perto de si”, desenvolvida junto dos Cuidados de Saúde Primários, com o objetivo de educar sobre os sinais e sintomas que devem levantar a suspeita da doença e promover a referenciação precoce dos casos suspeitos de doença ou dos familiares de doentes identificados. Destaco outra iniciativa com impacto nacional de uma série de ações de formação nos vários serviços de Anestesiologia do país sobre Doença de Fabry e Dor neuropática. Mais recentemente o Centro de Referência realizou ainda um curso de Miocardiopatias e DLS dirigido a cardiologistas dos países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP)”, revela ainda a Médica Cardiologista.

Tratamento domiciliário de um doente com DLS seguido no Centro de Referência de DLS do Hospital de Guimarães

Os profissionais do Centro de Referência são frequentemente palestrantes e moderadores em cursos de formação sobre DLS, a nível nacional e internacional. “O Centro de Referência colabora na formação pré-graduada dos alunos de Medicina da Escola de Medicina da Universidade do Minho, quer através de seminários teóricos, quer através de projetos de investigação ou teses de mestrado.”, acrescenta. O Centro de Referência de DLS do Hospital de Guimarães obteve recentemente a melhor classificação na avaliação dos Centros de Referência europeus em doenças raras. “O nosso Centro de Referência tem como missão promover cuidados de saúde de excelência e fomentar a investigação e formação na área das DLS. O reconhecimento da qualidade do nosso Centro de Referência a nível nacional e europeu é muito gratificante para os profissionais que diariamente se empenham nesta missão, contribuindo obviamente para fortalecer a confiança dos nossos doentes na qualidade dos nossos serviços e aumentar o número de doentes e profissionais de saúde que, a nível nacional e europeu, procuram o nosso Centro de Referência para prestação de cuidados ou pareceres clínicos. Este reconhecimento dá ainda projeção internacional ao nosso Centro de Referência, abrindo oportunidades de cooperação e parcerias de investigação com outros centros de referência ou universidades”.

“Tendo sempre como foco a excelência nos cuidados de saúde aos doentes, o nosso Centro de Referência implementou em 2020, de forma inovadora em Portugal, o tratamento domiciliário das DLS, respondendo às solicitações de longa data da Associação Portuguesa de Doenças do Lisossoma (APL). Agora com a publicação da Norma de Tratamento Domiciliário das Pessoas com DLS, esperamos que o nosso trabalho dê frutos e que o tratamento domiciliário destas doenças se torne finalmente uma realidade em todo o território nacional”, remata Olga Azevedo.

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