VALORIZA, cuida e protege o teu planeta

VALORIZA – parece uma ordem, um conselho ou até um pedido de socorro, e não poderia estar mais longe da verdade. A valorização energética dos resíduos, a sustentabilidade e o meio ambiente, e a valorização dos territórios de baixa densidade são temas com os quais nos deparamos todos os dias, seja no jornal, na televisão ou até em conversa com amigos. São, também, estes os principais temas em que se concentram os investigadores do Centro de Investigação para a Valorização de Recursos Endógenos. Paulo Brito, coordenador do VALORIZA, explica o porquê da investigação nestes setores ser cada vez mais importante.

Perspetiva Atual: O VALORIZA é o Centro de Investigação para a Valorização de Recursos Endógenos. Qual é a missão e os objetivos deste Centro?

Paulo Brito: O Centro de investigação VALORIZA tem como missão desenvolver trabalhos de forma multidisciplinar no sentido de ser um contributo para a valorização dos recursos endógenos de territórios de baixa densidade, de matriz rural, periférica e transfronteiriça.

PA: Quais são os principais valores promovidos pelo trabalho realizado no VALORIZA?

PB: São essencialmente quatro os principais valores promovidos pelo trabalho desenvolvido no centro: a) qualidade, procurando que a mesma seja reconhecida e disseminada em publicações de elevado nível científico; b) inovação, procurando desenvolver novas ideias e metodologias com elevada aplicabilidade e com foco na transferência de tecnologia; c) criação de rede de parcerias e parceiros de trabalho, pelo reconhecimento internacional do trabalho desenvolvido; d) sustentável com elevado grau de equidade para todos os que com ele pretendem desenvolver a sua atividade profissional e de investigação.

PA: Quais são as áreas temáticas em que a equipa do valoriza se concentra e de que forma estão organizados os investigadores?

PB: O centro apresenta 3 áreas de desenvolvimento: Energia e valorização de resíduos, Produção sustentável e ambiente e Valorização de territórios de baixa densidade e transfronteiriços.

PA: Pode-nos explicar um pouco a que se refere cada temática e qual a sua importância?

PB: A área da Energia e Valorização de Resíduosestá relacionada com o desenvolvimento de tecnologias e processos que permitam a conversão de materiais residuais e efluentes em produtos com valor, em particular, a conversão em biocombustíveis gasosos. Nesta temática temos estado muito focados na produção de gases renováveis utilizando tecnologias de gasificação térmica, bioquímica e eletroquímicas e procurando trabalhar em graus de maturidade tecnológica mais elevados numa perspetiva de demonstração de tecnologias.

Na temática da Produção Sustentável e Ambiente, o foco está na produção agrícola sustentável com o desenvolvimento de processos que permitam minimizar, por exemplo, o uso de água e aumentar a circularidade dos materiais que utilizamos.

Na área da Valorização de Territórios de Baixa Densidade e Transfronteiriços temos vindo a estudar as questões de cooperação transfronteiriça e a valorização do interior e zonas de baixa densidade com o objetivo de ser um contributo para a redução das desigualdades territoriais e para o desenvolvimento equilibrado do território.

PA: A produção sustentável e o bem ambiental é cada vez mais um tema debatido ao redor do mundo, sendo o crescimento sustentável um dos principais objetivos da União Europeia. Dentro desta área, que projetos do VALORIZA já publicados tiveram ou têm um papel relevante na contribuição de um Portugal mais sustentável?

PB: Vivemos uma necessidade premente de reduzirmos as emissões gasosas e ter uma efetiva descarbonização da nossa sociedade. Os combustíveis fósseis, que temos vindo a consumir de forma intensiva, ao longo dos últimos 100 anos, começam a ter consequências sérias e irreversíveis no equilíbrio ambiental do planeta. Alternativas aos combustíveis fósseis, hidrocarbonetos com elevado poder calorífico, não são fáceis de conseguir a preços competitivos. Porém, se queremos assegurar a sobrevivência das gerações futuras, a busca dessas alternativas não pode diminuir. Neste último ponto o Instituto tem vindo a desenvolver uma estratégia de trabalho muito consistente e, diria, assertiva, que nos permite ter hoje um conjunto de competências e infraestruturas instaladas para seremos um contributo positivo na procura de soluções para a nossa região e para o país.

O vetor energético que tem como base os gases renováveis, hidrogénio e metano, uma das áreas em que o Instituto tem vindo a trabalhar e a desenvolver um conjunto de projetos quer de formação quer de investigação. Este vetor é uma alternativa que pode ter uma contribuição significativa em todo o mix energético permitindo diferentes aplicações e vantagens quer ao nível do armazenamento de energia renovável e estabilizador da rede elétrica, quer a aplicações em mobilidade elétrica como combustível e a uma vasta gama de aplicações industriais. A cadeia de valor dos gases renováveis vai desde as tecnologias de produção de hidrogénio renovável, com base em eletrolise da água ou tecnologias de gasificação de biomassa, passando pelo seu transporte e armazenamento, até a sua utilização.

PA: Os projetos aqui desenvolvidos têm por base os objetivos de desenvolvimento sustentável estabelecidos pela União Europeia?

PB: Um dos grandes objetivos da União Europeia, bem espelhado no Pacto ecológico, é o objetivo da neutralidade carbónica para 2050. Esse grande desígnio requer um conjunto muito significativo de investimento e trabalho de investigação em projetos que permitam a produção de energia e combustíveis a partir de fontes e matérias-primas renováveis. Os projetos que se estão a desenvolver no VALORIZA vão essencialmente nesse sentido, ou seja, projetos que pretendem desenvolver soluções tecnológicas que permitam a valorização de resíduos com produção de biocombustíveis e energia. Faço referência a alguns projetos europeus que se estão a desenvolver: o Waste2H2, liderado pelo Politécnico de Portalegre, integra parceiros de três países diferentes, o KTH, da Suécia; ENEA, de Itália, e o KIT, da Alemanha e que tem como objetivo a conversão de resíduos em hidrogénio por tecnologias de gasificação térmica; o projeto HyfuelUp, financiado pelo Programa Horizonte Europa em 10,2 Milhões que irá demonstrar uma tecnologia inovadora para a produção de gás natural renovável (biometano) a partir de resíduos. Além do IPP, o  consórcio liderado pelo CoLAB BIOREF inclui mais três entidades nacionais (Instituto Politécnico de Portalegre, e as empresas Circle Molecule e Dourogás Renovável) e seis entidades públicas e privadas da Alemanha, Espanha, Grécia, Reino Unido e Suíça. A instalação desta tecnologia inovadora irá ocorrer em Tondela, distrito de Viseu. No PigWasteBioRefinery estamos a desenvolver uma biorrefinaria suinícola com base em processos biológicos, térmicos e eletroquímicos; é um projeto-piloto móvel demonstrador, que tem como objetivo a integração do conceito de biorrefinaria na indústria suinícola com base na valorização dos efluentes e resíduos gerados. Procura-se uma valorização total dos mesmos, assim como desenvolver e integrar diferentes tecnologias de tratamento e valorização de forma a obter produtos finais com valor e um processo de tratamento sustentável em termos ambientais e económicos.

Por fim, uma referência também ao projeto europeu RESIST, que pretende criar e validar soluções inovadoras, sensibilizar, alavancar a participação dos cidadãos e promover a exploração sustentável dos resultados nos diferentes mercados, sendo o foco em Portugal, a valorização de resíduos agrícolas e florestais, com um piloto na região Centro e Alentejo.

PA: Quais as metas mais urgentes a serem alcançadas?

PB: Estamos muito interessados em poder ser um contributo na descarbonização da indústria, procurando desenvolver soluções que permitam ser sustentáveis em termos económicos, ambientais e sociais. Assim, temos vindo a procurar que os nossos projetos de investigação e de desenvolvimento tecnológico sejam em parceria com entidades e empresas do território procurando contribuir para os problemas e necessidades do mesmo. Esta é a nossa principal meta.

PA: A valorização de territórios transfronteiriços tem sido outro tema constante nos debates políticos do nosso país. De que forma o VALORIZA contribui para a redução de desigualdades territoriais e que projetos ou iniciativas foram já propostas pelos vossos investigadores neste sentido?

PB: Têm sido vários os projetos que têm vindo a identificar problemas, dificuldades restrições que temos nos territórios do interior do país, tais como problemas a nível social, de saúde pública e até políticas de desenvolvimento, o que tem levado a que hajam propostas concretas. Há um conjunto de ideias que estão a fazer o seu percurso e estamos esperançados que o futuro do território não seja o seu abandono, mas que possa ser um lugar em que as novas gerações possam viver com qualidade e, acima de tudo, com possibilidade de ter trabalho.

PA: Um centro de investigação como o VALORIZA necessita também de outros colaboradores para atingir os resultados desejados. Quem são os parceiros nacionais e internacionais do VALORIZA e de que forma se encontra os parceiros ideais?

PB: Um dos aspetos que mais nos tem motivado, tem sido a perspetiva de podermos aumentar a nossa rede de parcerias nacionais e internacionais, tendo consciência clara que só assim podemos ser melhores técnica e cientificamente e adquirir maior relevância no desenvolvimento do território onde estamos inseridos e para o país. Assim, temos vindo a concorrer a vários projetos internacionais, que nos tem permitido aumentar as nossas redes de parcerias. Neste contexto, gostaríamos de destacar a Ação Cost WIRE – Waste biorefinery technologies for accelerating sustainable energy, da qual somos coordenadores, exatamente numa das temáticas importantes do centro, e que já conta com a participação de mais de 250 investigadores de cerca de 50 países.

PA: O VALORIZA é também uma unidade integrada no Politécnico de Portalegre. De que forma é alimentada esta ligação e qual o contributo dos alunos nas atividades de investigação?

PB: Entendemos que cada vez mais a aprendizagem ao nível do ensino superior deva ser feita com base no desenvolvimento de projetos (Project Based Learning), permitindo que os alunos tenham um contacto com problemas reais e que com eles possam adquirir competências. Temos vindo a utilizar os projetos que temos em desenvolvimento no centro precisamente para envolver os nossos alunos, em particular, os alunos de mestrado e licenciatura, mas também, dos Cursos Técnicos Superiores Profissionais (CTeSP). Esta preocupação do Politécnico com a melhoria das condições de ensino dos alunos tem vindo a ser também trabalhada e concretizada em projetos como o MERIDIES CONSORTIUM – upskilling and reskilling systemic solutions for accelerating the digital, energetic and circular transitions, iniciativa aprovada no âmbito do PRR e que tem como objetivo garantir uma oferta formativa alargada, no âmbito das transições digital, energética e da circularidade, procurando sempre aumentar os níveis de sustentabilidade ambiental.

PA: Que eventos ou iniciativas promovidas pelo VALORIZA, realizadas ao longo deste ano, destaca e quais os seus objetivos?

PB: Temos vindo a organizar várias iniciativas científicas e de divulgação, destacando-se o “Roteiro para o H2”, um projeto em parceira com a AIP, onde temos vindo a percorrer as 23 Comunidades Intermunicipais do território nacional apresentado o vetor energético do hidrogénio, bem como, divulgar projetos e iniciativas empresariais que estão a ser desenvolvidas. Destacamos ainda as diferentes iniciativas inerentes ao projeto Guardiões, um projeto que tem como objetivo assumir um elevado impacto na sensibilização e informação da sociedade civil, através de diversas iniciativas junto de instituições da administração pública, escolas e comunidade em geral, com particular ênfase para as diferentes conferências organizadas em torno da problemática das alterações climáticas, e que tem trazido ao Alentejo o melhor saber nacional e internacional sobre estes temas.

PA: E em relação às iniciativas planeadas para brevemente, gostaria de promover alguma?

PB: No próximo ano estamos a promover vários congressos científicos, destacando-se os seguintes:

III International Conference on Water Energy Food and Sustainability (ICoWEFS 2023), que irá decorrer em Leiria, de 10 a 12 de maio de 2023,

IV Bioenergy, que irá decorrer em Jaén, de 25 a 27 de outubro.

PA: Para concluir, quais são os planos desta direção para o futuro do Centro?

PB: O grande objetivo é o de continuar a ser um contributo no desenvolvimento do território, junto das suas entidades, empresas e indústrias procurando ser um catalisador de conhecimento pela promoção de parceiras nacionais e internacionais.


Paulo Sérgio Duque de Brito

É Licenciado em Engenharia Química, ramo de Processos e Indús- tria, pelo Instituto Superior Técnico; Mestre em “Corrosion Science and Engineering” pelo UMIST, Universidade de Manchester; Dou- tor em Engenharia Química, pelo Instituto Superior Técnico na área da electroquímica – sobre células galvânicas. Possui, também um MBA – Master os Biseness and Administration. É actualmente Professor Coordenador Principal, na Escola Su- perior de Tecnologia e Gestão, do Instituto Politécnico de Porta- legre, onde exerce actualmete funções de Presidente do Conse- lho Técnico Científico e Coordenador do Centro de Investigação de Valorização de Recursos Endógenos – VALORIZA (Avaliação de Muito Bom). As principais áreas de investigação estão relacionadas com bioe- nergia, tratamentos ambientais de resíduos, corrosão de materiais e produção galvânica de energia e hidrogénio. Tem cerca de 300 trabalhos publicados entre revistas científicas, capítulos de livros e apresentações em congressos. ORCID: 0000-0002-2581-4460

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