Amadeu Soares, Coordenador do CESAM

“Desenvolvemos e aplicamos conhecimento e tecnologia para cuidar do nosso futuro”

O CESAM – Centro de Estudos do Ambiente e do Mar, foi fundado na Universidade de Aveiro em 2002 e tem o estatuto de Laboratório Associado desde 2005, integrando um polo da FCUL desde 2017. Atualmente, o CESAM é composto por 227 doutores e 230 estudantes de doutoramento. Pertencendo à coordenação do CESAM, como vice-coordenador, desde a sua fundação, em maio de 2021 assumi as responsabilidades de coordenador científico.

A nossa missão é desenvolver investigação internacional de excelência, multi e transdisciplinar, sobre a biosfera, atmosfera, hidrosfera, litosfera e antroposfera, no “continuum” atmosfera-terra-oceano, enquadrada em Linhas Temáticas multidisciplinares. Promovendo o conhecimento científico, a transferência de conhecimento para os nossos parceiros e a ligação entre ciência e políticas. O principal objetivo é promover um uso eficiente dos recursos ambientais terrestres e aquáticos, desde a bacia hidrográfica até ao mar profundo, e uma economia mais competitiva, resiliente e sustentável.

Áreas de políticas públicas de atuação

O CESAM apoia cientificamente as políticas públicas nos desafios ambientais, de saúde, sociais e económicos:

Social e Científico: Estratégia Nacional para carreiras científicas e técnicas para doutorados;

Ambiente e Saúde: Estratégia Europeia para os Plásticos; Atualização do regulamento REACH da UE sobre substâncias químicas;

Clima: Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, Agenda I&I sobre Alterações Climáticas da FCT, Plano Nacional Energia e Clima, Pacto Ecológico Europeu;

Capital Natural: Plano Sectorial da Rede Natura 2000, Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030, Agenda I&I Agroalimentar, Florestas e Biodiversidade da FCT, Estratégia Nacional para o Mar; Estratégia de Biodiversidade 2030, Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável;

Ambiente e Economia: Estratégias de Especialização Inteligente Nacional e do Centro; Estratégia Europa 2020 para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo.

A nossa atividade

A nossa missão, visão e objetivos concretizam-se através da execução de projetos ganhos em concursos competitivos.  Em termos de volume financeiro, 40% do nosso financiamento provém de programas nacionais (via FCT, MAR2020, entre outros) e 60% internacionais (via H2020, HEuropa, entre outros). Somos, também, financiados através da prestação de serviços aos nossos parceiros, do setor privado ou do público, do tecido empresarial, organismos intergovernamentais e governamentais, câmaras municipais, autoridades portuárias, etc. Em particular nos últimos dois anos, 27% do nosso financiamento total provém de parcerias no âmbito do PRR.

Temos mais de uma centena de projetos em execução, nas áreas da missão do CESAM, ou seja, no continuum atmosfera-terra-oceano, usando conhecimentos de biologia e ecologia, física, química, geociências, ambiente e ordenamento, sociologia e economia do ambiente. Esta abrangência é o que mais nos diferencia das restantes unidades de investigação e laboratórios associados.

Refiro, muito sucintamente, apenas algumas dessas atividades:

Uma, financiada pelo ERC, aborda um aspeto muito peculiar em termos evolutivos: algumas lesmas do mar retêm cloroplastos funcionais nas células desde alguns dias até vários meses. Este projeto compara a resposta à incorporação de cloroplastos em diversas associações animal-alga, explora o impacto da produção de espécies reativas de oxigénio e investiga a contribuição de compostos derivados da fotossíntese para a fisiologia do hospedeiro. Ainda na área do mar, tem sido estudada a diversidade de invertebrados, microrganismos (fungos, bactérias), de diversos ambientes (extremos, marinho e plantas), tendo sido descrito um grande número de espécies novas para a ciência, sendo que algumas têm potencial como fonte de compostos naturais bioativos, com diversas aplicações. 

Na componente da modelação e previsão, desenvolvemos modelos hidrodinâmicos, de qualidade da água e de transporte de hidrocarbonetos/ microplásticos para sistemas estuarinos e zonas costeiras, visando a caraterização, avaliação do potencial económico (aquacultura ou energia das ondas/maré), impacto humano (dragagens ou eventos de poluição) e das alterações climáticas (inundações marginais, intrusão salina).

Também desenvolvemos e aplicamos modelos atmosféricos com vista à avaliação de recursos energéticos de origem renovável (eólica onshore e offshore, solar e hídrica); previsões de precipitação, vento (onshore e offshore) e radiação solar (horizonte 1-10 dias), com resoluções temporais e espaciais personalizáveis para a previsão de produção elétrica. O impacto de alterações climáticas nos recursos renováveis (vento, precipitação e radiação solar), a aplicação de algoritmos de Inteligência Artificial / Machine Learning para melhorar a previsão de vento, precipitação e radiação solar para produção de eletricidade são outras áreas da nossa intervenção, com elevado potencial de aplicabilidade e impacto económico.

Outro exemplo é a NavSafety, uma ferramenta para gestão portuária, combinando deteção remota (imagens de satélite, vídeo e drone) e métodos avançados de processamento no apoio à segurança da navegação, permitindo estimar, de forma contínua e em tempo quase real, a batimetria em embocaduras de portos marítimos e de recreio que estejam expostos a processos rápidos de assoreamento.

Focando-me um pouco na poluição, investigadores do CESAM participam na Parceria Europeia para a Avaliação de Risco de Substâncias Químicas, PARC, que visa facilitar a transição para a próxima geração de avaliação de risco, protegendo a saúde humana e o ambiente. De forma a atingir o objetivo de “poluição zero” do Green Deal, apoiando a Estratégia Química para a Sustentabilidade da União Europeia, estabelecendo um centro de excelência em avaliação de riscos. Foram estabelecidas parcerias estratégicas internacionais, no âmbito de dois projetos Twinning, do H Europa para incorporação da epigenética ambiental na análise de risco ecológico e a avaliação detalhada das concentrações e deposição de amónia nos ecossistemas.

Na área da resistência a antibióticos no ambiente têm-se estabelecido ligações entre poluição e resistências, identificando rios como reservatórios e agentes de disseminação de bactérias resistentes e genes de resistência. Identificaram-se ainda potenciais riscos para animais e humanos, relevantes para o desenvolvimento de ferramentas para avaliação da qualidade da água e gestão de ecossistemas aquáticos. Realço ainda os trabalhos com microplásticos, cujos impactos são ainda desconhecidos e cuja prevalência e remoção são desafios urgentes. Assim, desenvolvemos estratégias para mitigar a sua presença no ambiente, nomeadamente ferramentas biotecnológicas para a sua remoção e subsequente valorização da biomassa, obtendo compostos bioativos, num contexto de economia circular.

No domínio da biomassa e bioenergia temos um extenso trabalho de desenvolvimento e otimização de processos e tecnologias de conversão termoquímica, bioquímica  e química para produção de vetores energéticos e bioprodutos (energia térmica e elétrica), bio-combustíveis (gás de síntese por gasificação, bio-óleos e biochar/biocarvão por pirólise, biogás por digestão anaeróbia, biodiesel por transesterificação de óleos alimentares usados), e integrando estudos de avaliação de ciclo de vida para avaliar as melhores opções tecnológicas. Destaco a cooperação com o setor industrial, e o desenvolvimento de capacidade experimental instalada ao nível de protótipos laboratoriais e instalações à escala piloto.

Finalmente, destaco áreas de atividade que penso serem menos percecionadas pelos nossos parceiros. Por exemplo, numa perspetiva de zero desperdício, onde os insetos são ferramenta de circularidade, produzindo subprodutos como a proteína animal e entomofertilizante orgânico, assentando nos pilares da segurança alimentar, avaliando a possível acumulação de diversos contaminantes em insetos, bem como o potencial uso do entomofertilizante como uma solução sustentável para solos agrícolas.

Na área dos incêndios florestais desenvolvemos ferramentas para modelar o risco de erosão pós-fogo para apoio à decisão na gestão florestal e, em particular, na aplicação de medidas de estabilização de emergência, facultando aos agentes florestais instrumentos para apoio à tomada de decisão na gestão pós-fogo, incluindo um mapa nacional de risco de erosão do solo com identificação de áreas prioritárias, por forma a minimizar os impactos ambientais e económicos associados aos incêndios.

Termino com os nossos estudos na área da fisiologia do stress em plantas e a experiência acumulada pela equipa do CESAM num dos mais importantes agentes patogénicos de várias espécies do género Pinus, o fungo Fusarium circinatum. Este é causador do cancro resinoso do Pinheiro, e as nossas competências suportam, hoje, projetos que transvazam a ciência fundamental. Trabalhamos para induzir as defesas inatas das plantas e realizamos testes em condições reais de produção (Viveiros florestais) de produtos/conceitos testados laboratorialmente, o que representa um grande avanço para potenciar a operacionalização da ideia.

Trabalhamos em soluções pioneiras reclamadas pelos viveiristas e pela UE, pois as soluções disponíveis são limitadas pelo uso de agroquímicos. Impulsionamos uma produção florestal ambientalmente sustentável e mais competitiva, bem como a formação, a inovação e a cooperação com o sector empresarial através da procura de soluções práticas.

Em suma, no CESAM, todos colaboramos, desenvolvemos e aplicamos conhecimento e tecnologia para cuidar do nosso futuro.

Amadeu Soares, Coordenador do CESAM

Bolsa ERC, Projeto KleptoSlug

Financiamento do CESAM: UIDP/50017/2020 + UIDB/50017/2020 + LA/P/0094/2020

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