A urgência de impactar a saúde pública e a sociedade

O Instituto de Investigação do Medicamento, iMED, pretende estar cada vez mais próximo dos que necessitam da saúde e apresentar descobertas que impactam na sociedade. O presidente, João Gonçalves, demonstra o foco no crescimento nacional e internacional, ao englobar 29 grupos de investigação com 100 projetos em curso.

João Gonçalves – Diretor do i.Med.ULisboa

Perspetiva Atual: O iMED, como Instituto de Investigação do Medicamento, teve, por certo, um importante papel nos anos em que nos encontrávamos a viver uma pandemia. 2023 foi o primeiro ano pós-pandemia. Como é que foi vivido e que diferenças significativas registaram relativamente aos anos de pandemia?

João Gonçalves: A pandemia de COVID-19 limitou muito as atividades científicas do instituto, em especial a interação e o intercâmbio de conhecimentos entre os nossos investigadores. Neste reinício, os investigadores do Imed foram bastante bem-sucedidos na obtenção de fundos competitivos, apesar das difíceis circunstâncias financeiras. Os fundos do instituto aumentaram 20%, em comparação com o orçamento disponível antes da pandemia. Estes números positivos foram possíveis porque os nossos investigadores obtiveram financiamento através de concursos nacionais como internacionais, bem como de projetos com a indústria e serviços de investigação contratados. Durante o ano passado publicámos mais artigos que antes da pandemia e iniciámos a supervisão de 275 novos estudantes de mestrado e 32 estudantes de doutoramento.

Este foi um arranque para novas colaborações e projeto internacionais de um instituto de investigação onde os cientistas colaboram diariamente para desenvolver ferramentas e técnicas pioneiras para prevenir, detetar e tratar doenças humanas complexas. A pós-pandemia foi o restabelecimento de fortes alianças com parceiros industriais e com o setor da saúde para traduzir os conhecimentos científicos e benéficos para a sociedade.

PA: Quais foram os principais projetos de investigação deste último ano e que, de certo modo, assumiram um importante papel nas vossas três áreas de investigação (científica, tecnológica, transacional)?

JC: Os nossos projetos centram-se em múltiplas áreas científicas. Por exemplo, no domínio das doenças metabólicas, reconhecemos o papel do metabolismo em muitas doenças humanas que afetam a capacidade das células em realizar reações bioquímicas importantes que envolvem o processamento ou o transporte de proteínas, hidratos de carbono ou lípidos. Por conseguinte, estamos a estudar doenças hereditárias raras e a investigar novos alvos moleculares envolvidos na função celular para desenvolver terapias inovadoras para perturbações metabólicas subjacentes à diabetes, ao cancro e às doenças do fígado. Beneficiando dos nossos laços com a indústria farmacêutica, sintetizamos e analisamos potenciais medicamentos para os alvos identificados, enquanto trabalhamos para o desenvolvimento de novos dispositivos médicos com o mesmo objetivo. No domínio das doenças infeciosas, trabalhamos nos nossos projetos para compreender os mecanismos de infeção associados a ameaças existentes e emergentes, com vista ao desenvolvimento de abordagens multifacetadas capazes de visar a interação entre o hospedeiro e o agente infecioso, controlando simultaneamente a progressão da doença. O nosso objetivo é desenvolver vacinas e tratamentos eficazes para combater a propagação de doenças infeciosas e melhorar os cuidados clínicos. Os nossos esforços coordenados são dirigidos para a prevenção, deteção precoce e intervenção contra ameaças à saúde pública, incluindo a malária, o VIH e a Covid-19, bem como a tuberculose e as doenças fúngicas e parasitárias.

“As nossas colaborações internacionais (…) fazem com que o conhecimento inovador gerado no laboratório passe para tecnologias inovadoras e medicamentos que salvam vidas.”

Os nossos projetos tecnológicos focam-se na tradução dos conhecimentos científicos e tecnologias avançadas em soluções inovadoras no domínio dos cuidados de saúde. As nossas colaborações internacionais baseadas em parcerias fortes entre a comunidade científica, empresas farmacêuticas e de biotecnologia e o setor da saúde fazem com que o conhecimento inovador gerado no laboratório passe para tecnologias inovadoras e medicamentos que salvam vidas.

Nos projetos de translação estamos profundamente empenhados em promover a inovação em farmacoterapia e o acesso à mesma por parte das pessoas que vivem com doenças, desenvolvendo investigação translacional disruptiva para beneficiar a saúde humana. Este objetivo é impulsionado pelos esforços conjuntos do iMed com vários intervenientes no setor da saúde, incluindo decisores políticos, clínicos e profissionais de saúde e pessoas que vivem com doenças e as suas organizações e associações representativas.

“O iMed não só gera conhecimento científico, mas também estuda, monitoriza e propõe novas e mais eficientes estratégias de utilização de medicamentos e tecnologias da saúde.”

PA: No que considera que o iMED se diferencia relativamente aos outros institutos de investigação da mesma área?

JC: O iMed engloba 29 grupos de investigação, cujas atividades vão desde a investigação fundamental até ao desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas e de diagnóstico destinadas à promoção da saúde na nossa sociedade. Somos um instituto com caraterísticas únicas, uma vez que num único ecossistema juntamos especialistas focados na descoberta de novos alvos, especialistas no desenvolvimento de estratégias que permitam regular a função desses alvos, bem como investigadores que se focam nos requisitos necessários para que estas novas estratégias resultem em novas terapêuticas ou meios de diagnósticos. Este trabalho é desenvolvido em estreita colaboração com o meio clínico em que estamos incluídos na Universidade de Lisboa, bem como outros centros hospitalares nacionais e internacionais, e instituições centradas na avaliação da qualidade, segurança e eficácia de medicamentos.

PA: O iMED integra a Universidade de Lisboa e oferece treinos PhD, de mestrado e pós-doutorais. Como é que decorrem estes treinos? Que papel os alunos assumem na investigação?

JC: A investigação do iMed desenvolve-se em estreita colaboração com a Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa e, como tal, a formação das novas gerações de investigadores e de especialistas do medicamento assume um papel de destaque no nosso instituto. Desta forma, os alunos integram projetos de investigação em desenvolvimento no nosso instituto, desenvolvendo as suas atividades em estreita colaboração com os nossos especialistas, sejam professores ou investigadores. Esta colaboração contribui para o desenvolvimento académico dos nossos alunos, bem como para o avanço da nossa investigação. A estreita ligação entre os alunos e os nossos investigadores facilita a integração dos alunos dos diversos ciclos de ensino nas atividades dos nossos laboratórios. Além disso, os próprios alunos desenvolvem atividades tendo em vista a sua colaboração com os nossos laboratórios. Por exemplo, o Departamento de Inovação eCiência da FFUL tem um projeto denominado iMed.call, o qual tem em vista promover essa aproximação entre os estudantes da FFUL à investigação. Este projeto tem em vista a seleção de alunos que irão então participar nas atividades práticas do laboratório, adquirindo experiência e conhecimentos específicos relacionados com o projeto que escolheram.

Os alunos são também incentivados a participar nas palestras, seminários e conferências a decorrer no nosso instituto, de forma que haja uma atualização do seu conhecimento relativamente às descobertas mais recentes nas suas áreas de estudo. Para além de serem convidados a participar nas atividades de divulgação científica para apresentar os resultados da sua investigação, por exemplo, durante a conferência anualmente organizada pela comissão de alunos de pós-graduação do iMed.

PA: Que projetos de investigação estão ativos neste momento e quais os que estão planeados começar este ano?

JC: O iMed caracteriza-se por uma dinâmica de investigação intensa, e os seus cientistas são atualmente responsáveis pela condução de mais de 100 projetos de investigação, representando um orçamento superior a 4 milhões de euros, concedidos através de concursos competitivos, promovidos por instituições públicas nacionais, internacionais e privadas. Estes projetos abrangem as áreas da química, biologia e ciências farmacêuticas, tendo como objetivo central a descoberta de novos mecanismos moleculares que estão na origem e promoção de doenças oncológicas, inflamatórias, neurodegenerativas e metabólicas. O intuito é utilizar este conhecimento para a descoberta de novos medicamentos, tecnologias de saúde e implementação de novas e mais eficazes práticas terapêuticas.

PA: O iMED também desenvolve o seu trabalho em contexto internacional. Existe algum projeto de investigação atual que esteja a ser desenvolvido além-fronteiras?

JC: Na área da saúde, os problemas científicos apresentam uma complexidade significativa e uma urgência temporal cada vez maior, uma vez que muitos pacientes dependem desses avanços para melhorar a sua qualidade de vida. Por essas razões, a investigação na descoberta de novas estratégias terapêuticas requer uma colaboração aprofundada entre cientistas. O iMed é um centro de investigação com elevada implementação internacional, o que é evidente pelo número de artigos científicos com colaboradores internacionais, que no último ano ascendeu a 72% dos trabalhos produzidos pelos nossos cientistas.

Neste contexto, a maioria dos projetos em execução no iMed conta com a participação de colaboradores internacionais. Destacamos, neste âmbito, os estudos que estamos a realizar em consórcios internacionais liderados por cientistas do iMed, como o desenvolvimento de novos inibidores e nano-sistemas utilizados no tratamento do cancro da mama metastático, novas tecnologias para o desenvolvimento de vacinas na área da oncologia e infeções virais, bem como a descoberta de novas ferramentas químico-enzimáticas para o diagnóstico e tratamento de diferentes formas de cancro.

PA: Que objetivos e diretrizes foram definidas para este ano que acabou de começar?

 JC: Para o futuro, o iMed concentrar-se-á na capacidade de apresentar à sociedade novas soluções que beneficiem a saúde de todos. A realização deste objetivo exige um investimento interno em pesquisa fundamental nas áreas da oncologia, inflamação, neurodegeneração e metabólicas. O iMed possui capacidade tecnológica e científica para realizar descobertas relevantes nestas áreas da saúde pública, e estes esforços serão acompanhados por uma estratégia bem definida para disponibilizar as nossas descobertas aos pacientes.

Com esse propósito, o centro de investigação irá fortalecer as relações já existentes com a indústria farmacêutica, o setor da farmácia, os hospitais e diversas associações de pacientes, para realizar uma rápida translação das nossas descobertas para a sociedade.

O iMed não só gera conhecimento científico, mas também estuda, monitoriza e propõe novas e mais eficientes estratégias de utilização de medicamentos e tecnologias da saúde. Devido à sua relevância social, o iMed reforçará esta área para que possamos estar mais próximos de todos que necessitam de saúde.

iMed é financiado pela FCT (Fundação para a Ciência e Tecnologia) através dos projetos UIDB/04138/2020 e UIDP/04138/2020

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